Brasil enfrenta EUA na OMC por tarifaço e resgata protagonismo diplomático
Governo Lula inicia processo formal contra sobretaxas de 50% a produtos brasileiros, imposta por Trump com apoio da família Bolsonaro. Apesar de impasse institucional na OMC, ação é vista como gesto geopolítico e afirmação da soberania nacional
O governo brasileiro formalizou nesta quarta-feira (6) uma queixa contra os Estados Unidos na Organização Mundial do Comércio (OMC), em resposta às tarifas de 50% impostas por Donald Trump sobre produtos brasileiros. A medida marca o retorno do Brasil a uma política externa mais assertiva e estratégica, após tentativas fracassadas de solução diplomática.
O Itamaraty solicitou a abertura de consultas com os EUA, primeira etapa do mecanismo de solução de controvérsias da OMC. Embora a expectativa por uma solução efetiva seja baixa, a iniciativa tem peso simbólico e jurídico, servindo como instrumento de pressão internacional e afirmação do compromisso brasileiro com o multilateralismo.
Bloqueio dos EUA paralisa OMC e esvazia efeito prático da disputa
Desde 2019, os Estados Unidos vêm impedindo a nomeação de novos juízes para o Órgão de Apelação da OMC, o que compromete todo o sistema de resolução de disputas. Mesmo que o Brasil obtenha vitória no painel inicial, os EUA poderão recorrer indefinidamente, mantendo as tarifas em vigor sem consequência legal imediata.
Essa obstrução institucional, iniciada por Trump e mantida até hoje, enfraquece um dos pilares da OMC e evidencia a fragilidade das regras multilaterais diante de potências econômicas. Para diplomatas brasileiros, no entanto, levar o caso à OMC ainda é estratégico: cria um registro formal da violação, fortalece a posição nacional e pode embasar retaliações futuras.
Apoio do bolsonarismo ao tarifaço e ruptura com o pragmatismo diplomático
As tarifas impostas por Trump miram setores estratégicos da economia brasileira e, segundo documentos e declarações, foram articuladas com o apoio político da família Bolsonaro. O alinhamento ideológico entre os dois líderes de extrema direita resultou em um afastamento do Brasil de sua tradicional política externa pragmática e multilateral.
A ação do governo Lula representa, assim, uma inflexão: retoma a postura de defesa ativa dos interesses nacionais no cenário global e busca reverter a herança diplomática do bolsonarismo, que priorizou afinidades ideológicas em detrimento de resultados concretos para o país.
OMC em xeque: Brasil pressiona por revitalização do sistema multilateral
A ofensiva brasileira ocorre num contexto de crescente descrédito da OMC, que desde sua fundação, em 1995, funcionou como baliza contra guerras comerciais. A paralisia do seu órgão de apelação e a proliferação de medidas unilaterais colocam em xeque a eficácia do sistema.
Apesar disso, autoridades brasileiras acreditam que é fundamental seguir apostando nas regras internacionais. Casos anteriores, como as vitórias do Brasil sobre subsídios ao algodão e à cana-de-açúcar, reforçam a importância de manter presença ativa nesses fóruns, acumulando legitimidade e capital político.
Consequências do contencioso
As consultas entre Brasil e EUA terão um prazo de até 60 dias para buscar uma solução consensual. Se não houver acordo, o Brasil poderá solicitar a instalação de um painel de disputa. Embora o sistema de apelação esteja travado, o processo permitirá registrar formalmente o abuso, fortalecer alianças com outros países afetados por medidas semelhantes e preparar eventuais retaliações comerciais.
Com a ação, o governo Lula deixa claro que não aceitará passivamente ataques unilaterais e reafirma seu compromisso com uma ordem global baseada em regras, cooperação e respeito à soberania. A disputa na OMC é, portanto, tanto uma resposta à tarifa quanto um reposicionamento do Brasil na arena internacional.





