Contee envia carta ao Ministro da Educação após absurdos pronunciados sobre a formação docente

A Confederação Nacional dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino (Contee) torna pública a carta enviada ao Ministro da Educação, Aloizio Mercadante, em virtude dos absurdos pronunciados pelo Ministro sobre a formação docente.

Leia abaixo a carta da Contee

Excelentíssimo Senhor Ministro da Educação

Aloizio Mercadante

A Confederação Nacional dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino (Contee) representa quase 1 milhão de professores e técnicos administrativos que atuam na educação privada e, por isso, conhece de perto a realidade do setor. A Contee tem entre seus princípios a defesa da educação como direito e bem público, de responsabilidade do Estado. Para que esta seja uma realidade concreta, a Confederação luta pelo fortalecimento da educação pública, democrática e de qualidade, e entende que o estabelecimento da educação como direito também se dará por meio da regulamentação do setor privado de ensino, com a exigência do cumprimento do papel do Estado no controle, regulação, credenciamento e avaliação da educação, com as devidas referências sociais.

Pautada por essas bandeiras, a Contee viu, com profunda estranheza – para não dizer extrema perplexidade –, a seguinte declaração proferida por Vossa Excelência, em entrevista ao jornal Folha de S. Paulo: ‘‘se formássemos nossos médicos como formamos nossos professores, os pacientes morreriam’’. É de causar ainda mais assombro o fato de que tal disparate venha acompanhado da crítica ao desempenho das universidades que preparam os docentes, ‘‘principalmente no setor privado’’, como se isso não fosse permitido pelo MEC, ao autorizar o credenciamento e o funcionamento de tais instituições.

Há dois paradoxos nessa observação, os quais não poderiam ter sido cometidos por alguém que conhece tão de perto a política de linha privatista que tem sido adotada já há algum tempo pelo Ministério da Educação, a despeito das duras críticas feitas diuturnamente pela Contee. É precisamente essa política, Vossa Excelência, que faz como que os jovens médicos brasileiros, a exemplo dos professores, se formem cada vez em maior número também em instituições privadas. E também é essa mesma política que contribui para que muitas dessas instituições, uma vez autorizadas pelo MEC e recebendo repasses públicos por meio de programas como o Universidade para Todos (ProUni) e o Fundo de Financiamento Estudantil (Fies), estejam pouco ou nada interessadas em assegurar qualidade do ensino que ofertam, tratando sua atividade como mera transação mercadológica. Com isso, Excelentíssimo Ministro, talvez o senhor devesse se preocupar também com a precariedade da formação dos médicos, tanto ou mais do que com a dos professores, uma vez que, nesse caso, as controversas decisões políticas tomadas no âmbito do MEC não afetam negativamente apenas a educação, mas também colocam em xeque a saúde brasileira.

Como entidade nacional, por diversas ocasiões já nos manifestamos contrários a uma formação meramente tecnicista, e essa parece ser a visão que Vossa Excelência tem para a formação dos professores. Profissionais que cumpram com excelência uma prática distanciada da historicidade e crítica necessárias à educação formadora e transformadora. Talvez ainda pudesse reler o Manifesto “A Educação tem que ser Compromisso Prioritário” entregue a esse Ministério e assinado por inúmeras entidades nacionais, objetivando contribuir com políticas públicas que de fato pudessem assegurar o desenvolvimento soberano do país. Cabe aqui recordar alguns tópicos, talvez desapercebidos pelo Ministro, e que fazem referência à formação dos trabalhadores em educação, bem como o controle das instituições que a fazem -”  1-  de significativa expansão de oferta de ensino público, universal e de qualidade, em todos os níveis, de forma a extinguir gradativamente programas emergenciais que impliquem repasses de recursos ao setor privado; 2-   de diretrizes nacionais de carreira e de planos de cargos e salários que permitam tornar atrativa a profissão de professor, com o cumprimento do Piso Salarial Profissional Nacional da Educação, conforme o inciso VIII do artigo 206 da Constituição; 3-   de salários dignos, de investimentos em formação inicial e continuada, de políticas de saúde e de condições de trabalho adequadas para todos os trabalhadores da educação, com tratamento igualitário para ativos e aposentados; 4-  de mecanismos de controle, de regulação, de credenciamento e de avaliação da educação – função inalienável do Estado”.

Corrigir as falhas da formação docente no Brasil – e nós concordamos que elas existem, sim – não passa somente pela prática “tecnicista” de aprendizagem na sala de aula, citada por Vossa Excelência, mas, como já manifestamos, passa também pela garantia de qualidade da educação superior, tanto nas instituições públicas quanto nas instituições privadas, bem como pela valorização do magistério em todas as instâncias.

Como representante dos trabalhadores em educação que atuam no setor privado, a Contee defende que o  MEC precisa de fato assumir seu papel de zelar pela qualidade do ensino em todos os níveis, garantindo, assim, não somente a melhoria da formação docente, mas também respeito e valorização para os professores.

 

Educação não é mercadoria.

 

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