Educação não é mercadoria: a lucratividade das IES e o combate à mercantilização do ensino
A sanha por lucros – grande parte dos quais oriunda de dinheiro público – das instituições de ensino superior (IES) privadas que atuam no Brasil foi destaque de reportagem feita pelo correspondente norte-americano Dan Horch, do New York Times, e reproduzida por veículos brasileiros como o Diário do Comércio e o jornal O Tempo (leia aqui).
Na matéria, o repórter aborda o fato de que, cada vez mais, o ensino superior tem se tornado um negócio lucrativo no país. Segundo o texto, “a educação superior no Brasil está cada vez mais nas mãos de empresas com fins lucrativos” e, para atender “esse lucrativo mercado em crescimento, fundos de investimento privados norte-americanos e brasileiros, corporações e bancos de investimentos estão comprando e integrando instituições de ensino em ritmo acelerado”.
Trata-se de uma realidade denunciada e combatida há anos pela Contee, inclusive através da campanha “Educação não é mercadoria”, e que atinge seu ápice com a confirmação, na última semana, da fusão entre a Kroton e a Anhanguera, criando um monstro educacional avaliado em mais de R$ 24 bilhões – operação financeira contra a qual a Confederação lutou e cuja concretização repudia com veemência. A própria reportagem do New York Times afirma que “especialistas em educação alertam que a ênfase no aspecto comercial da educação nem sempre coloca os alunos em primeiro lugar”. No entanto, a passagem é rápida, logo seguida pela concepção equivocada de que, “apesar de tais preocupações, o sistema comercial provou ser interessante para um governo com recursos limitados”. Um argumento perigoso, que coloca em xeque a luta pelo fortalecimento de uma educação pública, gratuita, de qualidade socialmente referenciada.
Conforme denunciado mais uma vez pela Contee na última semana acerca da expansão do Fundo de Financiamento Estudantil (Fies) para a pós-graduação e do pleito das IES para que o fundo seja ampliado também para a educação a distância (EaD), a voracidade do setor privatista tem sido alimentada por decisões como a que garante, no Plano Nacional de Educação (PNE), que verbas para as “parcerias público-privadas” sejam contabilizadas entre os investimentos públicos em educação, o que, na prática, lima a exclusividade dos investimentos de 10% do Produto Interno Bruto (PIB) – como aprovado e sancionado – para a educação pública.
Como uma das armas para combater esse quadro, a Contee tem insistido na defesa veemente da aprovação do Instituto Nacional de Supervisão e Avaliação do Ensino Superior (Insaes). Como já destacado pela Confederação em diversas ocasiões e documentos, um dos pontos primordiais do texto é a prerrogativa, entre as funções do Insaes, de “aprovar previamente aquisições, fusões, cisões, transferências de mantença, unificação de mantidas ou descredenciamento voluntário de Instituições de Educação Superior integrantes do sistema federal de ensino”. Essa é uma medida essencial para assegurar ao Estado condições de garantir que o ensino não continue a ser tratado como mercadoria.
Outro ponto considerado fundamental pela Contee é o que estabelece a exigência, para credenciamento e recredenciamento de cursos, de que as IES estejam em regularidade perante as fazendas federal, estadual e municipal, a seguridade social, o fundo de garantia e a Justiça do Trabalho. Trata-se de outra questão imprescindível para combater a incorporação desmedida de instituições brasileiras de educação superior por grupos financeiros nacionais e internacionais que, depois de adquiri-las, promovem mudanças internas cuja finalidade é reduzir despesas e maximizar lucros, acarretando modificações em projetos pedagógicos de cursos que já passaram por avaliação, demissão de mestres e doutores e rebaixamento da formação dos estudantes e profissionais, em total despreocupação ou compromisso com uma educação de qualidade.
Além disso, passada a sanção do PNE, a Contee volta-se para a luta intransigente em prol de uma de suas principais bandeiras: a instituição do Sistema Nacional de Educação (SNE). Como destacado na cartilha “PNE: uma conquista das entidades e do movimento social”, “esta importante bandeira retorna com força agora, como ponto central da Conae/2014, que será um importante espaço para discussão e criação de elementos para a formatação da lei que instituirá o SNE.” A Contee enfatiza ainda que o reconhecimento de que a educação brasileira é sistêmica, com a devida regulamentação da educação privada, sob exigências legais idênticas às aplicadas à educação pública, é imprescindível para garantir a efetivação de conquistas expressas no PNE, inclusive em termos de valorização profissional.
Da redação