Por um Plano Nacional de Educação com equidade racial

Trata-se de agenda mínima para fortalecer valores antirracistas no ensino

Adriana Moreira
Doutoranda em educação (USP), é coordenadora de Educação e Equidade Racial da Uneafro Brasil

Douglas Belchior
Professor de história e cofundador da Uneafro Brasil

Acontece entre domingo (28) e terça-feira (30), em Brasília, a Conferência Nacional de Educação(Conae 2024), que tem por objetivo consolidar o texto-base do novo Plano Nacional de Educação (PNE 2024-34).

O Ministério da Educação é o responsável pela realização da Conae e pelo texto do PNE, que será enviado ao Congresso Nacional. Esse processo é compartilhado com o Fórum Nacional de Educação (FNE), que articulou conferências municipais e estaduais, cujos delegados eleitos trazem agora contribuições a serem debatidas e incorporadas à proposta.

O PNE é estratégico, pois consolida metas a serem perseguidas para o desenvolvimento da educação brasileira pelos próximos dez anos. São múltiplos os desafios. Aqui, nos atemos à sua dimensão racial.

Já são mais de 20 anos desde a promulgação da lei 10.639/03, que alterou a Lei de Diretrizes de Base da Educação e tornou obrigatório o Ensino de História da África, Cultura Afro-Brasileira e Africana nas escolas. O Conselho Nacional de Educação, em 2004, publicou as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais (Erer) e para o Ensino de História e Cultura Afro. No mesmo ano, foi desenvolvido o Plano Nacional de Implementação das Diretrizes para o ensino dessa disciplina. O Estado jamais estabeleceu um instrumento capaz de acompanhar e cobrar a implementação da lei, tarefa cumprida apenas pelos movimentos negros.

O resultado do não cumprimento das legislações educacionais para Erer é a manutenção histórica das desigualdades raciais na educação.

A Pnad Contínua 2022 revela que a escolaridade média da população negra (pretos e pardos) de 18 a 29 anos é de 11,3 anos de estudo. Já a da população branca é 12,4. Entre as pessoas negras com 60 anos ou mais, 23,3% não são alfabetizadas; entre as pessoas brancas, a taxa é de 9,3%. Entre pessoas negras com 15 anos ou mais, 7,4% são analfabetas, mais que o dobro da taxa encontrada entre as pessoas brancas (3,4%).

Segundo os dados do Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb 2021), 5,6% dos meninos pretos e 4,6% das meninas pretas entram com 8 anos ou mais na escola; 12% dos meninos pretos matriculados no ensino fundamental já abandonaram a escola ao menos uma vez; entre as meninas pretas que conseguem terminar o ensino médio, 28,2% já foram reprovadas ao menos uma vez —entre os meninos pretos esse índice é de 36,8%.

O Censo Educacional 2021 revela que 72,3% dos pardos e 73,5% dos pretos com idade entre 15 e 17 anos frequentavam o ensino médio ou já haviam concluído a educação básica. Entre os brancos da mesma idade esse número sobe para 82,1%. O estudo identificou que apenas 1% dos professores brasileiros possui formação de 80 horas em Erer. Em 2019, o Censo Escolar constatou que apenas 52,18% das escolas desenvolveram algum projeto e/ou ação vinculada à Erer. Ademais, a média das notas das avaliações institucionais dos estudantes negros são invariavelmente menores que a de estudante brancos.

Se quiser ser efetivo, o texto final do novo PNE deve estar comprometido com a melhoria das condições de aprendizagem e superação do baixo desempenho escolar dos estudantes negros, bem como com a correção de suas trajetórias educacionais; a ampliação da capacidade institucional das redes de ensino em promover a Educação para as Relações Étnico-Raciais; a consolidação da equidade racial dentro do Sistema Nacional de Educação; a garantia da disciplina de Erer nos cursos de licenciatura desde a formação inicial dos profissionais da educação; a formação permanente dos gestores educacionais na perspectiva da Erer; a ampliação de estratégias de indução de financiamento para ações para Erer nas redes públicas de ensino; o monitoramento por raça/cor e sexo nas trajetórias educacionais dos estudantes, entre outras iniciativas.

Trata-se de uma agenda mínima para a equidade racial, a Erer e o fortalecimento dos valores democráticos e antirracistas para a educação nacional e que a comitiva do Movimento Negro Educador Uneafro Brasil defenderá nos três dias de Conae.

Da Folha de S. Paulo

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