Sinpro/RS: MP de Bolsonaro cria empregos para mulheres e jovens, só que não

A Medida Provisória 1.116 e o Decreto nº 11.061 fragilizam programas de aprendizagem e precarizam condições de trabalho de mulheres e jovens, dizem especialistas

Por César Fraga 

Duas medidas assinadas recentemente pelo presidente da República, Jair Bolsonaro (PL), estão gerando críticas por serem mais um pacote de bondades para empresas que descumprem a lei. Além disso, fragilizam programas de aprendizagem e precarizam condições de trabalho de mulheres e jovens. Tratam-se da Medida Provisória 1.116 e do Decreto nº 11.061, ambos de 4 de maio de 2022.

As iniciativas fazem parte da estratégia do atual presidente e candidato à reeleição para buscar votos nos segmentos de mulheres e jovens, que segundo seus articuladores políticos serão eleitores necessários para torná-lo competitivo em relação ao seu antagonista, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que lidera as pesquisas.

Em análise publicada pelo Departamento de Economia e Estudos Socioecômicos (Dieese), na terça-feira, 9, o Programa Emprega + Mulheres e Jovens, do governo federal, criado por essas medidas, com a promessa de garantir ocupação para esses dois segmentos, lança mão de um conjunto de normas legais que precarizam a condição de mulheres e jovens no mercado de trabalho, além de incluir dispositivos que afetam o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) e o Programa do Seguro-Desemprego, inclusive com a alteração da legislação do regime de aprendizagem profissional.

De acordo com a economista e técnica do Dieese, Anelise Manganelli, o programa gera maior rotatividade, baixo tempo de permanência no emprego, baixos salários e reduzidas oportunidades para aqueles que não têm experiência anterior comprovada. Tudo isso, associado a uma reduzida adesão aos programas de aprendizagem e as múltiplas formas de contratação daqueles que precisam conciliar estudo e trabalho são fatores que contribuem para o desemprego juvenil e indicam  a necessidade de atenção pelos diversos atores sociais, em especial o governo, a partir de política pública que amenize às questões relativas à discriminação dos jovens no mercado de trabalho.

“São eles os que mais sofrem com a falta de oportunidades, e o governo indica que a medida é para impulsionar, melhorar, não é? Reduz o número de oportunidades, uma vez que permite contar em dobro determinadas vagas para cumprimento das cotas relativas a lei de aprendizagem, por exemplo. Além disso, alivia para empresas infratoras, concedendo uma série de incentivos para aquelas já autuadas, ou seja – aquelas que não cumprem sua responsabilidade social no que se refere inclusão dos jovens no mercado de trabalho”, sintetiza a economista.

Auditores entregam cargos

Em sinal de protesto às iniciativas do governo, auditores-fiscais do trabalho responsáveis por ações garantidoras do cumprimento das cotas nas empresas entregaram seus cargos no último dia 7 de maio.

A PEC e o Decreto representam, segundo os auditores de  todos os estados, a criação de um benefício para as empresas que atualmente descumprem a lei de cotas de aprendizes.

A MP 1.116 – complementada pelo Decreto 1101 – institui um programa de incentivo à contratação de mulheres e altera os termos da Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) no que diz respeito aos itens que tratam da aprendizagem profissional.

Os auditores, por sua vez, classificam como um “ataque” à legislação e aos programas existentes, já que para criar vagas e estimular empregos o governo suspende as autuações em caso de descumprimento de cotas durante o período em que as empresas estiverem regularizando a situação. Isso consta no inciso II do Artigo 26 da Medida Provisória.

Além disso, as empresas que descumprem a lei terão reduzido, em 50%, o valor da multa instituída no momento em que a auditoria constatou infrações.

Esse ‘perdão’ será destinado àquelas organizações que, voluntariamente, decidirem se integrar ao Projeto Nacional de Incentivo à Contratação de Aprendizes, também criado por meio da Medida.

A carta

Na a carta de entrega dos cargos coletiva de cargos de Coordenação de Fiscalização de Aprendizagem Profissional do Ministério do Trabalho e Previdência, divulgada no dia 7 e assinada pelos chefes da seção das 27 Unidades Federativas, as mudanças impedem o exercício do trabalho de fiscalização e significam um indulto às empresas infratoras.

Além disso, os servidores ressaltaram o prejuízo que isso significa na vida de milhares de jovens que podem ter o acesso ao mercado de trabalho negado.

Diz a carta: “em menos de 24 horas após o término do prazo para que adolescentes e jovens pudessem tirar o título de eleitor, o governo editou normativos que se revelam verdadeiro pacote de bondade a empresas infratoras da lei da aprendizagem e colocou em risco real a contratação de milhares de aprendizes em todo país. E no mesmo ato proibiu que o corpo de Auditores-Fiscais do Trabalho atuasse para coibir as irregularidades cometidas contra a lei do jovem aprendiz”.

De acordo com os auditores-fiscais, os prejuízos podem chegar até mesmo no combate ao trabalho infantil, já que os normativos assinados também preveem a retirada da prioridade da contratação de pessoas com idade entre 14 e 18 anos.

CIEE critica medidas

Em nota divulgada pelo Centro de Integração Empresa-Escola de Minas Gerais (CIEE-MG), a entidade argumenta, assim como justifica o Dieese, que todo esse arcabouço jurídico criado pelo governo federal precariza o programa de aprendizagem e pode resultar na redução de cotas que já não eram cumpridas.

“Nós chamamos a atenção para a falsa ideia de que a MP criará mais oportunidades, especialmente para os jovens em situação de vulnerabilidade. Eles são os que mais sofrem com a falta de oportunidades no País. A Lei da Aprendizagem já capacitou e incluiu milhares deles no mundo do trabalho e merece ser fortalecida para atender ao maior número de pessoas possível”, adiz a nota.

Deputados podem derrubar MP

Na Câmara dos Deputados já existe uma mobilização de parlamentares para derrubar as mudanças propostas pelo governo. As emendas apresentadas pelo relator da Comissão Especial do Estatuto do Aprendiz, deputado Marco Bertaiolli (PSD-SP), têm como objetivo excluir da MP todos os artigos referentes ao tema, além de fazer prevalecer a proposta que já vem sendo estudada pelos parlamentares.

“As alterações propostas nessa medida provisória são muito ruins, elas desvirtuam o papel da aprendizagem no Brasil de uma forma muito séria”, criticou Bertaiolli. “As únicas emendas que eu poderia apresentar são supressivas”, disse.

Bertaiolli informou que foi solicitado ao presidente da Câmara, Arthur Lira (Progressistas-AL),  que a MP seja relatada por um dos membros da Comissão Especial, que passou os últimos meses ouvindo agentes da sociedade envolvidos na questão da aprendizagem.

Do jornal Extra Classe, do Sinpro/RS

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