‘Vivemos uma falsa autonomia’: entregadores veem tendência à precarização em julgamento no STF

Presidente de associação alerta para risco de legalizar modelo sem direitos; categoria prevê mobilização nacional

O julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o vínculo empregatício de motoristas e entregadores de aplicativos está sendo acompanhado de perto pela categoria. Para Alessandro Sorriso, presidente da Associação de Motofretistas, Autônomos e Entregadores do Distrito Federal (Amae-DF), a decisão da Corte pode definir o futuro do trabalho no país.

O julgamento começou na quarta-feira (1º) com a análise de duas ações que discutem se motoristas e entregadores de aplicativos devem ter vínculo de emprego reconhecido com as plataformas digitais. O relator, ministro Edson Fachin, defendeu o reconhecimento da relação trabalhista, mas pediu vistas, o que suspendeu a decisão por 30 dias. Já a Advocacia-Geral da União (AGU) apresentou posição contrária ao vínculo, mas sugeriu que alguns direitos trabalhistas sejam garantidos aos trabalhadores de apps.

Segundo Sorriso, a chamada autonomia desses trabalhadores não passa de uma ilusão. “Nós vivemos um modelo de trabalho que é a mesma coisa que estar trabalhando na [Consolidação das Leis de Trabalho] CLT. Temos um patrão que nos diz as regras o tempo todo, nos dá ordens o tempo todo, nos pune se não fazemos uma entrega correta. Então vivemos uma falsa autonomia, isso está claro”, diz, em entrevista ao Conexão BdF, da Rádio Brasil de Fato.

O dirigente critica a pejotização e a exigência de que os trabalhadores se registrem como Microempreendedor Individual (MEI) para arcar com custos de seguro e previdência. “As empresas de aplicativos estão terceirizando o trabalho para tentar se livrar do vínculo empregatício, e essa terceirização faz com que o trabalhador, que já é precarizado, arque com mais um custo e ainda assim não tenha garantia devida”, aponta.

Ele ressalta que a ausência de direitos básicos tem impacto direto na vida e na saúde dos trabalhadores. “Nós estamos vivendo uma verdadeira epidemia de acidentes de trânsito aqui no Brasil e o SUS [Sistema Único de Saúde] está colapsado porque o número de acidentes está aumentando bastante. Os hospitais estão superlotados de motociclistas acidentados, principalmente com nós entregadores. Hoje em dia, quando um de nós. motoboys, cai, fica totalmente desamparado dependendo de vaquinhas, de ajuda de colegas, amigos e familiares”, denuncia.

Segundo o Departamento de Trânsito do Distrito Federal (Detran-DF), entre janeiro e abril de 2025, 27 motociclistas perderam a vida em acidentes de trânsito na região. Já o Hospital de Base de Brasília informou ter realizado mais de 670 atendimentos a vítimas de acidentes com motocicletas apenas neste ano, sendo esse o grupo que mais demanda cuidados entre as ocorrências de trânsito na capital.

Outro ponto citado por Sorriso é o sistema de punições das plataformas, que afeta diretamente a renda. “O trabalhador hoje segue uma série de regras e critérios impostos pelas empresas, é penalizado o tempo todo e impactado financeiramente, as famílias desse trabalhador são impactadas, porque com essas punições muitas vezes deixa ele sem trabalhar um, dois, três dias”, lamenta.

O presidente da Amae-DF reforça que a categoria pode convocar novos protestos nacionais a depender do resultado do julgamento. “Essa negação de vínculo vai dar o precedente para legalizar a precarização no geral, e afetar milhares de trabalhadores e o futuro do trabalho no Brasil, por exemplo, diaristas e garçons. Se precisar, sim, vamos nos organizar para marcar uma nova mobilização a nível nacional”, afirma.

Alternativas além da CLT

Outras vozes da categoria ouvidas pelo Brasil de Fato defendem alternativas “fora da CLT” para enfrentar a precarização sem abrir mão da autonomia. Para Júnior Freitas, liderança dos entregadores e coordenador do coletivo Trabalhadores Sem Direito, o vínculo empregatício é evidente pela forma como as empresas operam, mas a CLT já não contempla a realidade desses trabalhadores. Segundo ele, o desafio é construir um modelo que garanta direitos e segurança sem reproduzir a opressão e a baixa remuneração do regime tradicional.

Editado por: Maria Teresa Cruz

Fonte
Brasil de Fato

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