Base do governo Lula no Congresso

Existem vários parâmetros para medir a base de sustentação de governo, mas nenhum desses é infalível, especialmente em sistemas multipartidários e sem clivagem ideológica clara, como é o caso do Brasil. Os partidos e os parlamentares, especialmente ao centro e à direita do espectro político, costumam ser mais pragmáticos do que programáticos, fato que dificulta a mensuração precisa do posicionamento de cada 1

Antônio Augusto de Queiroz*

A classificação formal dos partidos — situação, oposição ou independente — costuma ser o critério mais efetivo para a definição do posicionamento das agremiações partidárias, mas sempre há dissidência em relação à orientação partidária, especialmente entre os parlamentares de perfil pragmático.

Para analisar o potencial da base de sustentação do governo Lula, vamos utilizar como referência 2 critérios: 1) a divisão dos partidos em 3 grupos: situação ou apoio consistente, apoio condicionado/independente e oposição; e 2) o resultado da eleição para a Mesa Diretora das 2 Casas do Congresso.

No primeiro parâmetro, recorte partidário, de acordo com os critérios da equipe da Consillium Soluções em Relações Institucionais e Governamentais, a conformação das bancadas partidárias em relação ao governo Lula apresenta a configuração a seguir.

Câmara dos Deputados:

  • apoio consistente (situação) de 140 deputados, formada por: PT (69), PDT (17), PSB (14), PSol + Rede (14), PCdoB (6), Avante (7), PV (6) e Solidariedade + Pros (7);
  • apoio condicionado (independentes) de 206 deputados, reunindo: União (59), PSD (42), MDB (42), Republicanos (40), Podemos + PSC (18), e Patriota + PTB (5); e
  • oposição de 167 deputados, composta por: PL (99), PP (47), do PSDB + Cidadania (18) e do Novo (3).

Senado Federal:

  • apoio consistente (situação) de 15 senadores, formado por: PT (9), PDT (3), PSB (1), Rede (1) e Pros (1);
  • apoio condicionado (independente) de 36 senadores, reunindo: PSD (11), MDB (10), União (10), Republicanos (3) e Cidadania (1); e
  • oposição de 30 senadores, composta por: PL (14), PP (6), Podemos (6), PSDB (4) e PSC (1).

Considerando potenciais dissidências nos 3 grupos, estimamos que o governo poderá contar com base máxima entre 330 e 364 deputados, e entre 51 a 57 senadores, dependendo do tema em pauta. Esse prognóstico leva em consideração a capacidade de articulação do governo e o fato de que os principais partidos declarados de oposição (PL e PP), formados majoritariamente de parlamentares pragmáticos, foi base nos 4 governos de PT no plano federal.

No segundo parâmetro, o da eleição das mesas diretoras das casas do Congresso, vamos utilizar como referência de apoio ao governo, no caso da Câmara, a votação da deputada Maria do Rosário (PT-RS) para o cargo de segunda secretária da Mesa, e do Senado, a votação do presidente reeleito da Casa, Rodrigo Pacheco (PSD-MG).

A deputada Maria do Rosário, que fez parte de chapa que incluía partidos dos 3 grupos (situação, independentes e oposição), expressa ou representa, melhor do que qualquer outro nome, o PT e o governo Lula. Ela recebeu 371 votos a favor e 134 votos em branco. Os votos a favor sinalizam o potencial máximo de apoio do governo na Casa e os votos em branco a oposição radical ou bolsonarista ao governo.

A reeleição do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, com 49 votos, fica aquém do potencial da base do apoio do governo no Senado. Pelo menos 10 dos 32 votos dados ao senador Rogério Marinho (PL-RN), não foram de oposição ao governo, mas decorrente de divergências regionais e de rejeição dos senadores lavajatistas à posição acertada do presidente reeleito de não concordar com a ideia desses parlamentares de criar CPI (comissões parlamentares de inquérito) para investigar os comportamentos e decisões de ministros do Supremo Tribunal Federal.

Assim, em qualquer parâmetro que se analise, inclusive a votação da PEC de Transição pelo Congresso anterior, o potencial de apoio ao governo Lula supera o número de votos mínimos indispensável para a aprovação de proposta de emenda à Constituição. É verdade que os partidos de oposição, com apoio de independentes, podem reunir força suficiente para criar CPI, mas, mesmo nesse aspecto com apoio dos presidentes das casas e boa coordenação e articulação política, o governo poderá evitar aquelas com potencial de paralisá-lo.

A composição do Congresso é liberal, do ponto de vista econômico, muito conservadora, sob a ótica dos valores, e está situada à direita do espectro político, cabendo ao governo do presidente Lula puxar esse pêndulo para o centro, pois dificilmente terá maioria para levá-lo para a esquerda. Assim, é preciso considerar a correlação de forças e ter calibragem nas propostas, sempre na perspectiva da democracia, da justiça e da inclusão social. Ademais, trata-se de base volátil, cuja consolidação ou ampliação dependerá, em grande medida, do sucesso do governo e da capacidade de honrar os compromissos de campanha e promover o desenvolvimento econômico e a redução da pobreza.

(*) Jornalista, analista e consultor político, mestre em Políticas Públicas e Governo pela FGV. Ex-diretor de Documentação do Diap, é autor do livro RIG em Três Dimensões: trabalho parlamentar, defesa de interesse perante os poderes públicos e análise política e de conjuntura, e sócio-diretor das empresas “Consillium Soluções Institucionais e Governamentais” e “Diálogo Institucional Assessoria e Análise de Políticas Públicas”. Publicado originalmente na revista eletrônica Teoria&Debate

Diap

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