Diretor da Contee e do Sinpro-SP apresenta a realidade do setor educacional privado para Agência Sindical
A educação brasileira sob ataque – Ailton Fernandes
A educação brasileira está sob ataque em várias frentes: sofre ataque especulativo, com o descaso do poder público, com a demagogia da política, com a inércia da sociedade, com o proselitismo de religiões e meios de comunicação e com a descrença das instituições.
Com relação à primeira frente, nas últimas décadas, temos observado um crescimento substancial de instituições privadas no setor. A chamada rede particular tem crescido no Brasil nos últimos cinquenta anos, seja porque a educação pública se deteriorou nesse período ou porque as famílias de classe média viram na escola privada um sinal de status social. O fato marcante desse fenômeno é o profundo abismo educacional que observamos entre os alunos de escolas públicas e privadas: uns com uma educação esmerada, com equipamentos e equipes pedagógicas que possibilitam uma educação de qualidade para que esses alunos possam seguir carreiras sólidas sem, contudo, na maioria das vezes, pensarem em projeto de nação, mas somente no seu crescimento profissional individual; outros, na sua maioria nas escolas públicas, sofrendo com prédios deteriorados e profissionais açodados pelas péssimas condições de trabalho. Uns convivendo com salas com poucos alunos; outros disputando carteiras escolares com seus colegas em salas superlotadas.
A especulação ocorre também no mito de que só porque a escola é privada ela é de qualidade. Ledo engano! Muitas escolas sequer oferecem segurança aos seus alunos, pagam baixos salários aos seus profissionais e pouco se importam em projetos pedagógicos seguros. Na avaliação das entidades sindicais, e essa é uma bandeira antiga, a elevação do Piso salarial da categoria poderia ser uma trava para que aventureiros não entrassem no setor. O Sindicato patronal é reticente nesta discussão, o que gera uma concorrência que beira ao canibalismo. Escolas com baixas mensalidades, com péssimas condições de trabalho e sem projeto pedagógico disputam o mercado de maneira desigual.
A especulação ocorre também no setor das universidades. O governo federal optou por utilizar um antigo instrumento, o FIES, para dar condições de continuidade de estudos à imensa massa de alunos que terminam o ensino médio e que não têm acesso à universidade pública. Para tanto, abriu os cofres para financiar os estudos de enorme contingente, com juros baixos e longo prazo para pagamento da dívida. Com isso, o governo almejava dar condições de estudos para esses jovens. No entanto, quem melhor observou essa ação foram os empresários que viram nesse financiamento uma maneira liquida e certa de ganhar dinheiro, com alunos cativos, preços estabelecidos pelas instituições, nenhuma inadimplência e lucros exorbitantes. O resultado foi um enorme ataque especulativo com grandes corporações surgindo, tornando-se S/As e controlando o mercado em muitas regiões na forma de monopólio. Somente em 2014, esse setor foi irrigado com quase 15 bilhões de reais. Esses empresários se aproveitaram de uma ação do governo para criar o “capitalismo sem risco”, com a viúva capitalizando o setor privado. Pior, quando o governo resolveu regulamentar essa irrigação, os empresários iniciaram uma grita que ecoou em toda sociedade, graças à sua capacidade de lobby nas esferas governamentais e, principalmente, nos meios de comunicação onde todos são patrocinadores.
O outro ataque à educação é realizado pelos governos estaduais. No Paraná, a polícia agredindo professoras e professores; no Rio Grande do Sul, o parcelamento dos salários; em São Paulo, o governo ignorando uma greve de 90 dias, se negando a reajustar os salários e fechando escolas. Situações assim ocorrem no País inteiro. As redes estaduais deterioradas pela falta de investimentos aumentam ainda mais o abismo educacional que estamos vivendo, com salas superlotadas e baixos salários, as greves se sucedem e a educação piora, já que não há projeto pedagógico que resista a tanta falta de aulas.
O caso de São Paulo é significativo. O governo alega que tem uma rede física para 6 milhões de alunos e que efetivamente só possui 3,8 milhões de alunos. Para resolver essa equação, fecha escolas. Pergunto: não seria o momento de dar um salto em qualidade e aproveitar essa gordura no sistema para diminuir a quantidade de alunos por sala de aula? Somente esta ação já seria um grande passo à qualidade tão propalada, já que salas cheias dificultam o aprendizado e a organização da disciplina pelos professores. Teríamos mais espaços e menos professores com as mais diversas síndromes afastados periodicamente do seu trabalho.
E por aí vão as frentes de ataques contra a educação. Políticos fazem proselitismos em campanhas defendendo o ensino integral, gastam milhões nessas campanhas e, quando voltam para as suas instituições, ameaçam a sua rede de fechamento de escolas, demissões e diminuição de jornada, como está fazendo Paulo Skaf, do Sistema S.
Revistas de grande circulação como a ‘Veja’, por exemplo, dão espaço a articulistas que criticam aqueles que sempre militaram pela educação, ofendendo-os e manipulando a opinião pública.
A sociedade, como um todo, pouco se mobiliza pela educação. A classe média paga a mensalidade e torna, para muitos, o aluno como um cliente, que paga e deve ser atendido a qualquer hora, a qualquer jeito, como se os profissionais de educação fossem serviçais e não agentes transformadores. Na rede pública, já vimos como os governos tratam a educação e o silêncio da sociedade para esse descalabro.
Este artigo não tem a pretensão de ser mais um espaço para lamúrias, pois, mesmo com todas as dificuldades apresentadas, os profissionais de educação continuam a fazer seu trabalho de maneira digna, honesta e capaz. No entanto, outros setores da sociedade também devem entrar nessa discussão de forma propositiva. Não é possível pensar em projeto de nação sem ser pensada a educação. Fica aqui a frase de Simón Bolívar, lapidar, precisa e pungente: ”As nações marcham para a sua grandeza ao mesmo passo que avança sua educação”.
Fonte: Agência Sindical