MPF/MG ingressa com ação para impedir “privatização” do hospital da UFJF
Objetivo é evitar que adesão à EBSERH possa resultar na precarização dos serviços públicos de educação e saúde, com violação à autonomia universitária e a diversos preceitos constitucionais
O Ministério Público Federal em Juiz de Fora (MG) ingressou com ação civil pública pedindo a anulação do ato administrativo que manifestou adesão da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) à Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (EBSERH).
Na prática, tal adesão significa a transferência da gestão do Hospital Universitário para a empresa, o que, segundo o MPF, contraria diversos normativos constitucionais. A própria Lei 12.550/2011, que criou a EBSERH, está sendo questionada perante o Supremo Tribunal Federal por meio da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 4895 proposta pelo procurador-geral da República.
“Isso porque a criação dessas fundações deve ser precedida de lei complementar que defina suas áreas de atuação, normativo esse que ainda não existe”, explica a ação.
Além disso, a nova entidade, empresa pública constituída sobre a forma de sociedade anônima, com personalidade jurídica de direito privado e patrimônio próprio, poderá contratar profissionais sob o regime celetista, inclusive definindo regime próprio de remuneração e gestão de pessoal, o que vai de encontro ao regime jurídico único previsto na Constituição para os órgãos da Administração Pública Federal.
Há o temor ainda de que o repasse da gestão agrave o problema da terceirização irregular no hospital, colocando em risco a prestação dos serviços oferecidos pela entidade, já que permitirá a contratação temporária de pessoal em processo seletivo simplificado.
Ao sinalizar com a implementação de um modelo “flexível” de gestão, a EBSERH constitui-se, na verdade, em uma empresa de natureza privada na estrutura do Estado, para prestar serviços públicos de educação e saúde.
Para o MPF, “o repasse da gestão do Hospital Universitário da Universidade Federal de Juiz de Fora à EBSERH poderia caracterizar, em um primeiro momento, o início da privatização desses serviços, e, ainda, o fim das pesquisas voltadas para os interesses sociais.”
Tal preocupação decorre do fato de que uma empresa pública de natureza privada visa primordialmente ao lucro, e, seguindo a lógica do mercado, tanto o conhecimento quanto a prestação de serviços que não gerem resultados financeiros deixariam de interessar à universidade.
Autonomia universitária – A ação também ressalta que a adesão à EBSERH pode violar a autonomia assegurada pela Constituição às universidades e instituições de pesquisa.
É que os hospitais-escola estão vinculados à correspondente instituição pública de ensino superior, funcionando em caráter complementar ao ensino ministrado nos cursos da área de saúde. Ou seja, as atividades de assistência médico-hospitalar desenvolvidas no Hospital Universitário se encaixam no eixo da extensão universitária, que funciona como um local de prática dos conteúdos acadêmicos, de experimentação e pesquisa aplicadas.
Por isso, repassar a gestão do hospital a uma entidade estranha à estrutura da universidade importa “em prejuízos significativos à qualidade não só do curso de medicina, como também de outros cursos da área de saúde ofertados pela UFJF”, ressalta a ação.
O próprio Tribunal de Contas da União (TCU) já se manifestou sobre o assunto dizendo que “a indissociabilidade do ensino, pesquisa e extensão das universidades prevista no artigo 207 da Constituição Federal, conjugada com a autonomia universitária também consagrada constitucionalmente, impedem que se admita a possibilidade de essas universidades entregarem a gestão de seus HUs, parte central da formação da mão de obra da saúde neste país, a uma entidade externa à universidade” (Acórdão TCU 3463/2012).
Risco de dilapidação – Outra ilegalidade apontada pelo MPF diz respeito à possibilidade legal de a EBSERH criar subsidiárias regionais, as quais poderão alienar, no todo ou em parte, o capital da entidade.
A ação lembra que, se em momento posterior a empresa vier a alienar parte de suas ações ao setor privado, empresas particulares poderiam ser autorizadas a operar no ensino público e na prestação de serviços de saúde, de competência do SUS. Além disso, “a medida também poderá ensejar dilapidação do patrimônio público, já que, neste caso, os bens pertencentes ao Estado passariam a receber tratamento afeto aos bens privados”.
O Ministério Público Federal pediu, liminarmente, a imediata anulação do ato administrativo da Reitoria da UFJF que manifestou adesão à EBSERH, bem como uma ordem judicial que impeça a universidade de firmar qualquer contrato tendo por objeto a administração do Hospital Universitário pela empresa, em especial no que se refere a atos de dispensa e contratação de pessoal.
A ação foi distribuída à 2ª Vara Federal em Juiz de Fora e recebeu o número 0001272-19.2014.4.01.3801.
Do MPF