Não há golpe sem elite econômica. Para analistas, Bolsonaro é ‘bode na sala’ e problema virá depois

Debate em universidade portuguesa analisa os desafios do próximo governo, com dificuldades políticas e econômicas

São Paulo – “O Brasil depois das eleições: Ameaças de golpe e o futuro do bolsonarismo” foi o tema do debate promovido nesta quinta-feira (29) pela Universidade Autônoma de Lisboa (UAL) e o Observare, núcleo de relações internacionais da instituição. Os brasileiros convidados a debater não veem risco de um golpe “clássico”, por meio da força. Mas manifestam preocupação com o futuro em um possível governo já sem Jair Bolsonaro.

Coordenado pelo professor da UAL Felipe Vasconcelos Romão, o debate teve a presença do professor Reginaldo Nasser, de Relações Internacionais da Pontifícia Universidade Católica (PUC) de São Paulo, e do jornalista Sergio Lirio, redator-chefe da revista CartaCapital. O anfitrião e alguns presentes na plateia insistiram na questão sobre possíveis distúrbios e conflitos a depender do resultado eleitoral. A preocupação com a violência existe, até pelo bolsonarismo presente nas forças policiais, mas Nasser e Lirio não acreditam que a situação política evolua para um golpe.

Isolamento internacional

Ainda assim, o professor da PUC observa que o país vive uma situação inédita no pós-ditadura: a frequente ameaça de golpe. Independentemente de ser factível, provável ou possível, o fato é que esse tema se repete cotidianamente, atrapalhando o processo eleitoral. Mas ele chamou a atenção para outro fato inédito, que foi a aprovação de resolução, pelo Senado americano, em favor da democracia no Brasil. O atual presidente está “completamente isolado” internacionalmente, disse Nasser.

“Esse projeto golpista do Bolsonaro nunca esteve em momento tão frágil”, avaliou Lirio. Além da manifestação do Senado, ele chama a atenção para recente manifestação da embaixada dos Estados Unidos no Brasil em favor da democracia, “que me pareceu uma resposta pública a uma pergunta privada”. O jornalista cita ainda o jantar ocorrido nesta semana entre o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e empresários, e conclui: “Nunca houve golpe sem Estados Unidos e a elite econômica”. O professor Nasser reforçou esse ponto de vista, praticamente com as mesmas palavras.

Os problemas e o bode

O redator-chefe de CartaCapital vê problemas efetivos no pós eleição no cenário que um possível governo Lula vai encontrar, que para ele contrasta com certa “euforia” de campanha. “O Bolsonaro, como tenho dito, é só um bode na sala. Precisa tirar para reencontrar todos os problemas que, inclusive, levaram a Bolsonaro. Quando ele for removido, todos os problemas que levaram ao bode vão continuar lá.”

Por exemplo, a presença de uma extrema direita que “saiu do armário e a gente descobriu que era muito maior do que a gente imaginava”. Além disso, analisa, a composição da Câmara deverá ser muito parecida com o atual – ou seja, conservadora. Com projeções de que o PL tenha, inclusive, a maior bancada do parlamento. E há questões que, para o jornalista, o Brasil terá que resolver um dia: as limitações de um governo de coalizão e o papel dos militares na política brasileira.

Quem paga a conta?

A situação econômica também preocupa. “Não vai dar mais para ser um ganha-ganha”, afirma Lirio, referindo-se ao primeiro governo Lula, em 2003. “Alguém vai ter que pagar a conta.” E não serão, arremata, os quase 700 mil mortos pela covid, os 33 milhões de famintos, os precarizados e os desempregados. “São quatro anos para praticamente refazer as estruturas do Estado”, constata.

Mas ele também acredita que há grande chance de a eleição se resolver no primeiro turno. “Basicamente, as pessoas não estão querendo esperar 28 dias. Serão 28 dias a mais de caos, de confusão, de baderna, que o Bolsonaro quer armar. Não tem mais nenhuma coisa organizada, ele aposta no caos.”

Nasser também destacou a ascensão do extremismo de direita, não só no Brasil. “Vários grupos foram se articulando, e com conexão internacional. A direita se internacionalizou e a esquerda ficou provinciana.”

Rede Brasil Atual

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