Urnas em 2 de outubro são chance ímpar de mudança

Por José Geraldo de Santana Oliveira*

No alegórico conto de 1941, Loteria em Babilônia, o emblemático escritor argentino Jorge Luís Borges narra a hipotética história da loteria nessa cidade, que se constituiu um dos grandes impérios da antiguidade, sendo hoje integrante do Iraque.

Segundo a narrativa de Borges, enquanto os prêmios da loteria babilônica se limitavam a moedas cunhadas em prata, pouco interesse despertava, poucos jogavam, levando-a ao fracasso.

Para Borges, esse fracasso se deveu ao fato de a virtude moral da loteria, com prêmio em moeda, ser nula, pois que não se dirigia a todas as faculdades humanas; dirigia-se, unicamente, à sua esperança.

Porém, quando os prêmios se diversificaram, passando a representar suplício para os vencedores, que iam desde simples multas à prisão, da mutilação de um membro à morte, os babilônicos se entregaram ao jogo freneticamente.

O Brasil, em 2018, como que a dar razão à metáfora do escritor irlandês Oscar Wilde, consoante a qual a vida imita muito mais a arte do que é ela por imitada, resolveu imitar a arte de Borges, elegendo no segundo turno da eleição presidencial Bolsonaro, com voto de 57,8 milhões de eleitores – cerca de 39,2% dos 147,3 milhões aptos a votar –, que representaram a maioria dos que compareceram e votaram.

Mas, ao contrário do que ocorria em Babilônia, em que os prêmios eram alternativos e dependiam da álea (risco, acaso, sorte), no Brasil, o fatídico prêmio, Bolsonaro, reunia e reúne todos os suplícios possíveis e imagináveis, tais como incompetência, vigarice, fraude, intolerância, desemprego, fome e mortes.

Além do que, sua eleição foi escolha consciente, não guardando nenhuma relação com risco e/ou acaso; parafraseando a obra do escritor colombiano Gabriel Garcia Marques, Crônica de uma Morte Anunciada, a escolha de Bolsonaro representava a garantia de tragédia certeira, com nefastas consequências por tempo indefinido.

Quem escolheu conscientemente Bolsonaro, para desgovernar o Brasil por quatro anos, agiu como os personagens da obra do escritor escocês Robert Louis Stevenson, O Clube dos Suicidas, que frequentavam esse clube na expectativa de ser sorteados para morrer; com a diferença que, na obra de ficção, apenas um era sorteado por vez; a eleição de Bolsonaro representou a escolha do Brasil, como nação soberana, como Estado Democrático de Direito, para morrer sob seu governo facínora, que se iniciou ao 1º de janeiro de 2019.

Ao reverso do romance desse mesmo escritor escocês, traduzido como O médico e o Monstro, em que o personagem Dr. Jekyll possuía dupla personalidade, o lado bom, que era o médico, e o ruim, o monstro, Bolsonaro só encarna o monstro, muito mais impiedoso do que o da obra de ficção.

Hegel, citado por Marx, em O 18 do Brumário de Luís Bonaparte, observava que todos os fatos e personagens de importância na história do mundo, acontecem, por assim dizer, duas vezes; tendo Marx, na referida obra, acrescentado a essa assertiva que a primeira vez como tragédia, a segunda, como farsa.

A história do Brasil, como que a contrariar essa sentença, mostra que fatos e personagens medíocres e que provocam tragédias com altíssimo poder deletério dos tecidos político, social, econômico e cultural, acontecem, como farsa, por várias vezes; assim foi com a eleição de Jânio Quadros, em 1960; o golpe militar, de 1964; o golpe dentro do golpe, com o AI-5, em 1968; a eleição de Collor, em 1989; o golpe do impeachment, em 2016; e a eleição de Bolsonaro, em 2018.

Em que pesem todos os gigantescos danos causados pela teratológica farsa Bolsonaro, que, com certeza, deixarão marcas indeléveis por dezenas de anos a fio, em 2022 haverá um fenda no tempo, com as eleições gerais marcadas para o dia 2 de outubro, quando o Brasil poderá reencontrar-se consigo e com sua inexorável trajetória rumo ao porvir, redimindo-se de seu maior e mais caro erro de todos os tempos, dizendo retumbante e sonoro não a Bolsonaro e a tudo de monstruoso que ele representa.

Como magistralmente registrado por John Carpenter em seu instigante filme O Homem das Estrelas (Starman), de 1984, o que o ser humano tem de mais genuíno, o que o faz único, é sua capacidade de vencer as adversidades. Espera-se, ansiosamente, que isso se concretize nas realçadas eleições, que se revestem de relevância jamais vista com tamanha dimensão.

Se essa oportunidade for perdida, não se sabe se nem quando haverá outra, pois a própria existência do Brasil, como nação livre e democrática, estará irremediavelmente comprometida, muito mais do que se encontra. Eventual novo sim a Bolsonaro abrirá largos para trevas inimagináveis.

É dever de todo/a cidadão/ã consciente, que tenha o mínimo de amor pelo Brasil e seu povo laborioso e pugna pelo presente e futuro de luz, em oposição às trevas de agora, propagar essa chance ímpar de mudança e de, aos 2 de outubro de 2022, registrá-la nas urnas, para que a posteridade possa de novo sorrir.

Que assim seja!

*José Geraldo de Santana Oliveira é consultor jurídico da Contee

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