Reflexão sobre os 25 anos da Constituição
Por Celso Napolitano*
Sempre que a Constituição Brasileira de 1988 faz aniversário – e agora está em seu 25º – a sociedade costuma refletir sobre as conquistas nela incorporadas, lembrando o momento político, as mobilizações, as lutas e disputas havidas no período Constituinte, nos anos de 1987 e 1988.
Cinco aspectos foram determinantes para os avanços, especialmente na área social:
a) a redemocratização, após 25 anos de ditadura; b) o método de elaboração da Constituição; c) a unidade de ação e a mobilização popular; d) o foco do governo apenas dois aspectos do texto em debate; e) o fato de ter acontecido antes do Consenso de Washington.
A Constituinte foi o coroamento do processo de redemocratização, com o povo participando ativamente da construção do novo ordenamento jurídico. O desabrochar da cidadania, após 25 anos de ditadura, representou uma força simbólica imensurável. Foi nesse clima que todas as camadas da sociedade, em particular, os assalariados, lutaram pela remoção do entulho autoritário e pelo reconhecimento de direitos, inclusive os sociais, sufocados ao longo do período autoritário.
O método de elaboração da Constituição, sem um projeto prévio e com intensa participação popular, foi outro elemento determinante para os avanços em matéria de direito e cidadania. O PMDB, o maior partido da Constituinte, teve a prerrogativa de indicar os relatores e negociar a presidência das oito comissões temáticas as 24 subcomissões temáticas, três para cada comissão, além da presença majoritária na comissão de sistematização, a instância que antecedia às votações de plenário. Os relatores, sem exceção, eram parlamentares progressistas dos pontos de vista político e social, contribuindo para a constitucionalização dos direitos.
A intensa participação popular, feita de modo coordenado, teve papel decisivo. Além das emendas populares, com milhares de assinaturas, os setores organizados se fizerem presente nas audiências públicas. No mundo do trabalho, por exemplo, o Diap, com apoio das centrais, confederações, federações e sindicatos existentes à época, coordenou a emenda consensual do movimento sindical, cuja íntegra foi incorporada ao relatório da subcomissão dos direitos dos trabalhadores e servidores públicos.
O Governo federal, por sua vez, estava focado apenas em dois temas: o sistema de Governo e a duração do mandato do então presidente da República. Tendo sido vitorioso em ambas as propostas, deixou os constituintes livres de pressão governamental em relação aos demais temas.
Nos dois temas em questão, o presidente Sarney atuou fortemente para manter o presidencialismo e reduzir a duração do mandato de seis para cinco anos, derrotando a tendência da Constituinte pelo sistema parlamentarista e por quatro anos de mandato.
A Constituição Brasileira, especialmente na ordem econômica e nos aspectos sociais – em particular a seguridade –, incorporou conquistas importantes, contrariando a política neoliberal dos Governos Ronald Reagan, nos Estados Unidos, e Margaret Thatcher, na Inglaterra.
A reação dos organismos internacionais, defensores do Estado mínimo, foi imediata: apenas um ano após a promulgação da nossa Constituição, chegaram ao consenso sobre um receituário neoliberal de dez itens, o Consenso de Washington, que deveria ser imposto aos países subdesenvolvidos ou em desenvolvimento, sugerindo, inclusive, que fossem incorporados à própria Constituição, via reforma.
As circunstâncias fazem o momento.
Não fossem aquelas circunstâncias favoráveis, certamente nossa Constituição, a exemplo da do Chile e de outros países latino-americano, teria tido um viés neoliberal, sem proteção às empresas e à economia nacional e, principalmente, sem previsão constitucional de direitos sociais e trabalhistas, mas com a privatização da saúde e da previdência social, motores da política de proteção social no Brasil.
Viva a Constituição de 1988!!!
*Celso Napolitano
Professor, presidente da Fepesp e do Diap