21° Consind debate atualização do sistema sindical brasileiro

Mesa que tratou dos desafios e perspectivas na atual conjuntura sindical e trabalhista teve a participação de Antônio Lisboa e Clemente Ganz Lúcio

As diretrizes para o projeto de valorização e fortalecimento da negociação coletiva e atualização do sistema sindical brasileiro foram apresentadas, na manhã deste sábado (29), aos participantes do 21° Consind (Conselho Sindical) da Contee. O documento é resultado do trabalho de elaboração conjunta das centrais sindicais realizado desde fevereiro.

A apresentação foi feita por Clemente Ganz Lúcio, do Fórum das Centrais Sindicais, durante a mesa “Conjuntura sindical e trabalhista — desafios e perspectivas”. Como reforçado por ele, os objetivos da proposta são: negociação coletiva valorizada e fortalecida; direito de negociação coletiva para servidores públicos; sindicatos representativos; representação sindical ampliada; agregação sindical incentivada; autonomia sindical para a organização e o financiamento; participação de todos no processo de transição; unidade fortalecida; e autonomia para regular e operar o sistema de relações do trabalho.

Contexto laboral no mundo

Antes da apresentação da proposta das centrais por Clemente Ganz Lúcio, o secretário de Relações Internacionais da CUT, Antônio Lisboa, que também é membro do Conselho de Administração da Organização Internacional do Trabalho e vice-presidente da Confederação Sindical Internacional, situou os problemas laborais brasileiros no contexto mundial.

“Muitos dos problemas que temos hoje já tínhamos em 2019. Mas a pandemia da covid-19 serviu para descortinar as injustiças que já vinham caminhando há muitos anos e que têm a ver com o avanço do neoliberalismo”, apontou Lisboa.

“Estamos ainda debatendo [com o governo] o que fazer com os males que a reforma trabalhista nos trouxe”, disse. Mas, segundo ele, embora não com a profundidade da Lei 13.467/17, “nos últimos anos, tivemos mais de 70 reformas trabalhistas no mundo inteiro”.

“Os estados nacionais continuam cedendo à pressão do sistema financeiro”, criticou Lisboa. “Os ataques não aconteceram nem acontecem só no Brasil.” Assim, para ele, “a precarização do trabalho é outro desafio imenso que temos que enfrentar no mundo inteiro”.

Outro elemento é o trabalho de plataforma. “A chamada economia de plataforma é uma espécie de galáxia em que a gente vive hoje. São centenas de plataformas que estão hoje dominando as relações laborais no Brasil e no mundo”, considerou.

Incidência nos fóruns internacionais

Para enfrentar esse processo, conforme Lisboa, “é preciso que tenhamos capacidade de nos organizar globalmente”, de modo que incidir nos fóruns regionais e  nas cadeias de valor é fundamental”. Nesse sentido, ele citou o lançamento, previsto para este ano, do Fórum Sindical da Amazônia, e atuação sindical nos Brics, na OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) e na OIT (Organização Internacional do Trabalho).

“Na OIT, temos três questões fundamentais. A primeira é garantir o direito de greve. Se a gente perde o entendimento da OIT, imagine o que isso vai se desdobrar nos vários países, principalmente nas democracias mais frágeis”, ponderou. “O segundo é a regulação do trabalho de plataformas. Existe expectativa de construir uma norma internacional até 2025 para regulá-lo. E o terceiro é uma transição justa. Para mudar o modelo de produção dos altos índices de carbono para modelos mais sustentáveis, o que é necessário, é preciso saber como fazer isso sem colocar nas costas dos trabalhadores.”

“Nova” classe trabalhadora

Por fim, Lisboa abordou outro grande desafio: a atualização do modelo organizativo “para os trabalhadores diante da realidade que vivemos hoje”. “Como conseguir organizar essa ‘nova’ classe trabalhadora?”, provocou.

A questão também foi abordada por Clemente Ganz Lúcio, logo em seguida, na mesa mediada pelo coordenador da Secretaria de Organização Sindical, Relações de Trabalho, Relações Institucionais e Juventude da Contee, Elson Paiva, e pela coordenadora da Secretaria de Relações Internacionais, Cristina Castro.

“É muito importante que olhemos para frente e tenhamos capacidade de compreender que há um processo de mudança profundo no sistema produtivo, na organização das empresas, na organização do trabalho, tudo isso mediado por transformações tecnológicas que são extensas. As mais variadas atividades humanas estão sendo transformadas em atividades econômicas”, colocou.

Especificamente sobre a chamada economia de plataformas, Clemente destacou a “brutal redução do custo do trabalho com a substituição do trabalho humano pela tecnologia, com eliminação de postos de trabalho ou geração de postos de trabalho extremamente precários e vulneráveis”. Combater isso pressupõe que os trabalhadores respondam “qual é a forma organizativa para fazer sua agenda avançar” e um debate com governo “sobre qual é o enquadramento econômico e previdenciário dessas empresas”.

Atualização do sistema sindical

Em seguida, o representante do Fórum das Centrais Sindicais passou às considerações, propriamente ditas, sobre o projeto de valorização e fortalecimento da negociação coletiva e atualização do sistema sindical brasileiro.

A íntegra do documento foi encaminhada aos participantes do Consind, mas um dos principais destaques feitos por ele foi quanto à manutenção do artigo 8° da Constituição, inclusive o inciso II (“é vedada a criação de mais de uma organização sindical, em qualquer grau, representativa de categoria profissional ou econômica, na mesma base territorial, que será definida pelos trabalhadores ou empregadores interessados, não podendo ser inferior à área de um Município”. Para isso, contudo, segundo ele, será preciso que a entidade tenha regras democráticas claras e taxa de representatividade condizente.

Outro destaque foi quanto à contribuição solidária de custeio (ou contribuição negocial), devida por todos os abrangidos pelo instrumento coletivo (sócios e não sócios), com percentuais de distribuição pela estrutura vertical (sindicato, federação, confederação e central sindical).

“Estamos propondo que a contribuição negocial financie toda a estrutura sindical. É um financiamento a ser realizado por todos os trabalhadores e trabalhadoras, sem direito de oposição individual e com o direito de oposição em assembleia.”

Clemente abordou ainda a proposta de criação do Conselho Nacional de Relações do Trabalho, composto por câmaras de autorregulação dos trabalhadores e empresarial. “Não vamos fazer mudança da organização, mas criar instrumento garantidor de que seremos capazes de atualizar nosso sistema sindical, de uma autorregulação.”

A intenção é que um projeto de lei tripartite — construído por trabalhadores, empresários e governo — seja levado ao Congresso Nacional até setembro.

Táscia Souza

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