Câmara contraria governo, acelera projeto do Novo Ensino Médio, e texto deve ser votado ainda este ano

Como pano de fundo, há uma série de atritos no campo político e divergências no texto do projeto

Por Gabriel Sabóia — Brasília

Três dias após o governo retirar a urgência do Projeto de Lei que traça as diretrizes do Novo Ensino Médio, em uma tentativa de empurrar os debates e a votação sobre o tema para 2024, a Câmara aprovou um novo requerimento de urgência, pautado pelo presidente da Casa, Arthur Lira (PL-AL), com objetivo de fazer com que a matéria seja votada ainda neste ano. A expectativa é de que o Projeto vá ao Plenário na próxima semana. Ver o relatório aprovado ainda neste ano significaria mais uma derrota dos governistas no Congresso.

No que diz respeito ao texto, o principal entrave é sobre a definição da carga horária. O atual texto prevê ampliação da jornada da parte comum, a Formação Geral Básica, mas fica abaixo da proposta apresentada pelo Ministério da Educação de Lula. Pelas regras atuais, são previstas 1800 horas de formação básica. O relatório feito pelo deputado Mendonça Filho (União-PE) aumenta para 2100. Os governistas, no entanto, querem 2400 horas. Além desta divergência técnica, os governistas removeram a urgência com o objetivo de liberar a pauta da Câmara para os temas econômicos, de maneira a não obstruir a pauta para medidas arrecadatórias.

Mas, como pano de fundo, há uma série de atritos no campo político: ao tirar a urgência do projeto do Novo Ensino Médio, o governo provocou a ira de Lira pelo entendimento de que “o poder Executivo não pode ditar o ritmo do Legislativo por atos de ofício”. Por outro lado, com a decisão de pautar o projeto, Lira exerce pressão por uma troca no comando do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE).

O ministro da Educação, Camilo Santana, é alvo de críticas por travar verbas destinadas pelos parlamentares para o FNDE: segundo levantamento do GLOBO, apenas 4% do dinheiro tinha sido liberado até outubro. Esse montante, cerca de R$ 500 milhões, pode ser usado em projetos como construção de creches, em escolas da educação básica e na compra de ônibus escolares.

O ministro fez questão de indicar uma pessoa de confiança para assumir o FNDE ao ser empossado em janeiro. Antes de comandar o Fundo, a secretária Fernanda Pacobahyba trabalhou ao lado do ministro na Secretaria da Fazenda do Ceará. À época, o nome de Pacobahyba no FNDE incomodou o centrão, que foi tirado de cena após comandar o fundo na gestão de Jair Bolsonaro. Durante o governo Bolsonaro, o FNDE passou por episódios de corrupção, como alterações no sistema interno para liberação de novas obras.

Nesta terça, em outro ato simbólico, a Câmara aprovou um PL que garante bolsa para estudantes do Ensino Médio. A escolha do deputado Pedro Uczai (PT-SC) para a relatoria do texto ocorreu em 29 de novembro, dia seguinte à publicação da Medida Provisória do governo — esta era uma das principais medidas governistas na área da Educação neste ano. Ao garantir a aprovação da matéria por Projeto de Lei, Lira conseguiu retirar o protagonismo do ministério comandado por Camilo Santana.

Nos bastidores, congressistas contrários ao atual texto do Novo Ensino Médio acusam Camilo Santana de “jogar parado”. As críticas feitas pelo Congresso ao ministro da Educação por falta de diálogo com os parlamentares não são novas, como mostrou reportagem do GLOBO em outubro. De acordo com fontes ouvidas pelo GLOBO, Santana e Mendonça ainda não conversaram desde a retirada da urgência.

Tarcísio Motta (PSOL-RJ) foi um dos que criticou o relator do projeto, Mendonça Filho:

— Nós passamos o ano de 2023 inteiro debatendo o assunto do ensino médio, consulta pública, audiência pública, debate, mobilização. As entidades representativas de professores e estudantes, todos se debruçaram e chegaram a uma conclusão: é preciso mudar o novo ensino médio. Nós estávamos juntos com muitos movimentos sociais dizendo que era preciso revogar o novo ensino médio. Mas chegamos ao final com essa ideia de que era preciso haver uma mudança. E esta mudança se consubstanciou num projeto que o governo mandou pra cá. E o problema é que estamos no final do ano de 2023 pra votar o projeto do governo? Não. Pra votar o relatório do ministro que implantou o ensino médio que precisa ser mudado — afirmou.

Mendonça disse que as mudanças tendem a modernizar o ensino brasileiro:

— Quem dá aulas, quem planeja o ensino brasileiro, se beneficiará com a aprovação neste ano. A rede pública agradece a esta medida. Somos uma casa de leis, que pode, sim, atender às demandas da sociedade, modernizando o ensino — afirmou.

De O Globo

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