O silêncio nada inocente de Wizard, empresário da educação

Carlos Wizard Martins, bolsonarista empresário de estabelecimentos de ensino de alimentação e de material esportivo – dentre outros empreendimentos – e acusado de integrar o “ministério paralelo da saúde”, do Governo Bolsonaro, responsável pela política criminosa que já levou a mais de 500 mil mortes de brasileiras e brasileiros devido à pandemia do coronavírus, refugiou-se no silêncio durante a sessão da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Senado, que ia ouvi-lo nesta quarta-feira, 30. “É preciso esclarecer os detalhes de um ‘ministério paralelo da saúde’, responsável pelo aconselhamento extraoficial do governo federal com relação às medidas de enfrentamento da pandemia, incluindo a sugestão de utilização de medicamentos sem eficácia comprovada e o apoio a teorias como a da imunidade de rebanho”, disse o senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE), autor do requerimento de convocação de Wizard.

Levando vantagem em tudo

Carlos Martins é um dos empresários que mais faturam no Brasil. Fundou o Grupo Multi – dono das redes de escolas de idiomas Wizard– e depois o vendeu por R$ 2 bilhões, em 2014, para a multinacional britânica Pearson, a maior empresa de aprendizagem do mundo. A rede passou a se chamar Wizard by Pearson. A própria empresa emitiu nota, no dia do depoimento à CPI, considerando “curioso” que, apesar de continuar usando a palavra “Wizard” em seu nome, o empresário agora é concorrente da marca.

Em 2017, Martins anunciou a aquisição de 35% da WiseUp, sua antiga concorrente, por R$ 200 milhões. O investimento foi realizado pela sua empresa Sforza e pela Santorini, de seu filho Charles. Com o negócio, tornou-se sócio de Flávio Augusto da Silva, que fundou a WiseUp em 1995. Augusto da Silva, por sua vez, havia vendido sua rede em 2013 para a Abril Educação e a recomprou no final de 2015.

A família de Wizard Martins tem atuação diversificada no varejo e nos esportes, negócios que, segundo Carlos, “propiciam a saudabilidade” de seus consumidores. É dele a rede de varejo Mundo Verde, empresa do segmento de produtos Naturais, Orgânicos e Bem-Estar, e as de alimentação nada saudável Taco Bell, KFC e Pizza Hut, além das marcas de produtos esportivos Topper, Rainha, Academia Palmeiras e Ronaldo Academy, do ex-jogador Ronaldo.

Em 2020, Carlos Martins se filiou ao Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), a convite do governador João Doria e foi considerado para ser o candidato do partido nas eleições municipais de Campinas. Recusou e, após 15 dias de filiado, deixou o partido, preferindo manter-se ao lado do governo de Jair Bolsonaro, com quem Doria rompeu relações.

Privilégio privado

Cotado para integrar a equipe bolsonarista no Ministério da Saúde, disse que o governo deveria revisar dados e recontar mortos pelo COVID-19. Devido à repercussão negativa da proposta, que poderia afetar seus negócios, informou seu afastamento da política, pedindo desculpas às famílias que se sentiram ofendidas. Para não perder clientela, fez a Mundo Verde emitir nota dizendo que, mesmo sendo seu dono, “desde 2018 não atua na gestão da empresa” e que a rede leva “bem-estar” aos consumidores e não tem “qualquer ligação com governos ou partidos”.

No início deste ano, o empresário articulou a obtenção de vacinas para o setor privado, e não apenas para o Sistema Único de Saúde (SUS), privilegiando os empresários . A compra por parte da iniciativa privada faria com que pessoas mais pobres e mais vulneráveis ao vírus acabassem ficando para trás na fila da imunização, aumentando a desigualdade na proteção contra o coronavírus. Ainda nesta semana, seu nome foi ligado a um negócio suspeito envolvendo a compra de vacinas pelo governo por meio de uma empresa sediada em Maringá.

Wizard, que não é médico e nem possui experiência na área de saúde, organizou um grupo de discussões com médicos defensores de tratamentos sem comprovação para discutir a pandemia.

Na CPI, nesta quarta-feira,discursou citando versículos bíblicos e negou fazer parte do gabinete paralelo. Em seguida, refugiou-se no silêncio, apoiado em um habeas corpus concedido pelo ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF). “Respeitosamente, eu me reservo o direito de permanecer em silêncio”, repetiu 71 vezes, ao longo da sessão.

Em contrapartida, o relator Renan Calheiros (PMDB-AL) apresentou vídeos em que o empresário afirma o apoio ao uso do tratamento precoce, e afirmou que ele teria contribuído, assim, para a disseminação de informações erradas sobre a Covid-19, o que teria levado mais de meio milhão de brasileiros a óbito. “Os machões da internet ficam caladinhos na CPI”, disse o senador.

Martins deveria ter prestado depoimento em 17 de junho, mas evitou responder a convocações, alegando que estava nos Estados Unidos. Diante do fato de a CPI ter aprovado sua condução coercitiva, acabou concordando em comparecer no dia 30. Ele teve seu sigilo bancário, fiscal, telemático e telefônico quebrado a pedido da comissão e, ao desembarcar no Brasil, na terça-feira, teve seu passaporte apreendido pela Polícia Federal.

Carlos Pompe

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