“São Paulo estar fora do PNLD é escola com partido”, denuncia Professora Bebel

Em entrevista ao Contee Conta, deputada estadual, que também é dirigente da Apeoesp, questionou interesses econômicos e ideológicos por trás da decisão do governo paulista

São Paulo fora do Programa Nacional do Livro Didático é privatização da educação? Foi para responder a essa e outras perguntas que o Contee Conta recebeu, nesta segunda-feira (14), a professora Maria Izabel Azevedo Noronha, mais conhecida como Professora Bebel, que é deputada estadual em São Paulo pelo PT e também segunda presidenta da Apeoesp (Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo).

“Essa é a questão central para nós. O fato de o estado de São Paulo abrir mão de 10 milhões de livros e 120 milhões de reais, referentes a livros que já foram escolhidos, por grandes especialistas”, denunciou. “Retirar o livro dificulta o acesso ao conhecimento.”

No início de agosto, o governo de São Paulo anunciou que o estado não vai aderir plenamente ao PNLD e que, em vez disso, substituirá os livros impressos distribuídos gratuitamente pelo Ministério da Educação por material próprio e 100% digital. Entre as várias questões por trás da decisão foi apontada a ligação do secretário estadual de Educação, Renato Feder, com plataformas e institutos e fundações privadas. Feder é, inclusive, dono da empresa Multilaser, na qual há uma linha completa de equipamentos para informática. O conflito de interesses está sendo investigado pelo Ministério Público.

Disputa ideológica

O rebuliço que a notícia provocou fez o governo de Tarcísio de Freitas (Republicanos) voltar parcialmente atrás e dizer que os alunos da rede estadual de São Paulo, do 6º ao 9º ano, vão receber impresso o material didático elaborado pelo governo paulista. “Fizemos um movimento muito rápido e o governador e o secretário tiveram que recuar. Porque a pandemia já deu uma lição e demonstrou que, em São Paulo, 2,2 milhões ficaram sem poder acessar às aulas, porque não tinham acesso a computador”, apontou a Professora Bebel. “De novo o poder econômico ia ditar quem podia estudar nas escolas públicas.”

O problema, porém, não se resume à acessibilidade, abarcando também os interesses privatistas e a questão ideológica. “São Paulo está dizendo que vai fazer uma espécie de pensamento único. O currículo paulista, que segregou do resto do País”, criticou a deputada. “Não basta imprimir, não dá conta [de resolver o problema]. Que apostilas são essas? Quem foi que escolheu? Qual é a metodologia? Quais são os temas que são emergentes na sociedade paulista? São Paulo estar fora do PNLD é escola com partido.”

Questão nacional

A conversa contou com a participação do coordenador da Secretaria de Assuntos Educacionais e Formação da Contee, Allysson Mustafa, que localizou a medida do governo paulista no espectro nacional da disputa ideológica encampada pelo bolsonarismo — sendo Tarcísio um de seus presumidos herdeiros —, que quatro anos atrás também elegeu a educação crítica como inimiga.

Não por acaso, a notícia sobre a saída de São Paulo do PNLD se soma à portaria divulgada pela Secretaria de Educação do estado, estabelecendo “apoio presencial, em sala de aula”, por parte da gestão escolar. A medida da Coordenadoria Pedagógica determina que, pelo menos duas vezes por semana, as aulas terão que ser monitoradas, inclusive com a produção de relatórios. Além disso, professores e estudantes da rede estadual de ensino amanheceram, na última quinta-feira (10), com um aplicativo do governo do estado instalado em seus aparelhos de telefone celular sem seu consentimento.

“Estamos vivendo momentos que não exatamente novos, porque eles já foram ensaiados alguns anos atrás, mas voltam com alguma forma”, considerou Allysson, ressaltando que a educação, de novo, é a “bola da vez”. “A disputa pela educação, que já apontávamos quatro anos atrás, é justamente a disputa pela ideologização, que nunca esteve conosco propriamente, em que pese muitos acusarem os professores, de forma completamente descabida”, expôs o diretor da Contee.

“A rigor, a doutrinação vem em ações como essas: quando você invade a privacidade, quando instala aplicativo, quando desconsidera as liberdades individuais, quando desconsidera os pactos feitos, como o do Programa Nacional do Livro Didático, e tenta, pela via de uma politização de fato, fazer uma mudança estruturante na educação do estado de São Paulo, a partir do material didático a ser oferecido aos estudantes. Enxergamos aí algo que é muitíssimo perigoso, porque mexe de maneira equivocada, não republicana e autoritária com algo muito caro para a sociedade brasileira, que é o trato com a educação.”

Confira o programa Contee Conta na íntegra:

Táscia Souza

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