Surda às críticas, maioria da CCJ aprova reforma da Previdência

Senadores governistas e ligados ao grande capital fizeram ouvidos de mercador e aprovaram, na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), nesta quarta-feira, 4, o relatório do senador Tasso Jereissati (PSDB-CE) à reforma da Previdência (PEC 6/2019). Foram 18 votos favoráveis e 7 contrários ao texto-base da proposta que altera a regras de aposentadoria. As denúncias contra os efeitos nefastos da reforma do Governo Bolsonaro, em todas as audiências realizadas na Câmara e no Senado, foram desconsideradas pela maioria parlamentar, ligada aos interesses empresariais.

A principal mudança imposta pela PEC é a fixação de uma idade mínima (65 anos para homens e 62 anos para mulheres) para servidores e trabalhadores da iniciativa privada se tornarem segurados após a promulgação das mudanças. Além disso, diminui o valor da aposentadoria, que será calculada a partir da média de todos os salários, em vez de permitir a exclusão das 20% menores contribuições. A reforma também aumenta o tempo para se aposentar, eleva as alíquotas de contribuição para quem ganha acima do teto do INSS (hoje em R$ 5.839) e estabelece regras de transição para os atuais assalariados, dentre outros ponto prejudiciais aos assalariados.

PEC paralela

Fazer ouvido de mercador é se fazer de surdo, não dar importância ao que se fala. Ouvir só o que lhe interessa. Foi o que fez a maioria dos parlamentares do Congresso, a partir dos presidentes da Câmara (Rodrigo Maia, DEM-RJ) e do Senado (Davi Alcolumbre, DM-AP) e dos relatores, deputado Samuel Pereira (PSDB-SP) e senador Tásso Jereissati (PSDB-CE). Todos repetiram o mantra governamental de que a reforma propiciará economia para o país numa Previdência deficitária, sem nunca apresentar números que comprovem essa tese.

No caso dos mercadores da antiguidade, o ouvido mouco era uma forma de evitar barganhas no negócio e evitar críticas aos produtos oferecidos. Na CCJ, os defensores da reforma fecharam um acordo, antes da votação, para acelerar a tramitação da PEC paralela da reforma da Previdência, fazendo algumas mudanças, mas mantendo a essência antipovo do texto que veio da Câmara. Dentre as emendas de redação e supressões de dispositivos, estão o Benefício da Prestação Continuada (BPC) e a pensão por morte, alterações que não resultam em nova análise da PEC pelos deputados.

Jereissati rejeitou a maior parte das 489 emendas apresentadas, especialmente pela oposição, após a leitura de seu relatório que ocorreu no último dia 28. Apenas acatou a emenda de autoria de Eduardo Braga (MDB-AM), que estipula que pensionistas não vão poder receber valor inferior a um salário-mínimo. Também acolheu outras mudanças, como a emenda que acrescentou os trabalhadores informais dentre os trabalhadores de baixa renda com direito ao sistema especial de Previdência.

Foram suprimidas parte da regra de transição para os profissionais expostos a agentes nocivos, como os mineiros de subsolo, que elevava progressivamente os requisitos para que esses trabalhadores conseguissem a aposentadoria, e trechos que poderiam impedir a criação da contribuição extraordinária cobrada dos servidores públicos, aposentados e pensionistas dos estados e municípios em caso de deficit.

Outras mudanças, que exigiriam alterações substanciais no texto, ficaram para a PEC paralela.

Além da inclusão de estados e municípios, a PEC, ainda não apresentada, poderá trazer a cobrança de contribuições previdenciárias de entidades filantrópicas, do agronegócio exportador e do Simples, regime simplificado de tributação para pequenas empresas, entre outros pontos. Alessandro Vieira (Cidadania-SE), considerou que está sendo assinado “quase que um cheque em branco, na esperança de que os acordos sejam cumpridos”.

No mesmo viés, Veneziano Vital do Rêgo (PSB-PB) disse não acreditar “que esta PEC paralela consiga sair do Salão Azul [Senado] para o Salão Verde [Câmara] e lá receber acolhida, aprovação. Absolutamente, e nós sabemos disso, não vamos nos enganar. Nós não temos o direito de enganar quem está em casa”.

A voz não ouvida da oposição

Contrários ao texto do relator, os senadores Fabiano Contarato (Rede-ES), Weverton (PDT-MA) e Paulo Paim (PT-RS) apresentaram votos em separado. Manifestaram discordância em relação a diversos pontos da proposta, como a alteração do cálculo dos benefícios, o aumento das alíquotas de contribuição, a redução do Abono do PIS/Pasep, entre outras. Fabiano Contarato considerou as mudanças feitas pelo relator insuficientes e sugeriu a supressão de outros pontos no voto em separado. Ele recomendou a aprovação da PEC com mais de 80 emendas apresentadas pelos senadores. Weverton e Paim defenderam a rejeição integral da PEC 6/2019.

Os senadores que advogaram os interesses dos trabalhadores se queixaram do andamento rápido da proposta no Senado e defenderam a prerrogativa dos senadores de alterarem o texto. Humberto Costa (PT-PE) e Rogério Carvalho (PT-SE) reconheceram a necessidade de uma adaptação das regras previdenciárias, mas o que está em discussão na proposta, segundo eles, é um desmonte do sistema de proteção social. Para Humberto, o governo mente ao dizer que a proposta combate privilégios: “Os que ganham até R$ 1,3 mil por mês são os mais atingidos. O discurso de combate aos privilégios é conversa mole”. Enfatizou que a reforma não tem preocupação em viabilizar uma Previdência autossustentável e que seu objetivo é instaurar uma política “fiscalista” para atacar os desequilíbrios da Previdência.

Para Telmário Mota (Pros-RR), “essa reforma não vai recuperar o crescimento econômico do país e, ao contrário, ela vai afundar o país. É uma grande falácia, os gastos da Previdência são menores que os gastos do pagamento do juros e amortização da dívida pública”.

Marcos Do Val (Podemos–ES), que apresentou emendas para beneficiar policiais e agentes de segurança, defendeu mais tempo para debater a proposta: “Assim como eu apresentei várias emendas objetivando corrigir injustiças que afetam todos os trabalhadores, vários senadores também apresentaram, pois entendem que é absolutamente necessário discutir a fundo as mudanças que a reforma da Previdência causará na vida de todos os brasileiros”.

Em uma tentativa, sem êxito, de adiar a votação, o senador Weverton (PDT-MA) pediu vista pela apresentação da complementação do voto, mas a presidente da CCJ, Simone Tebet (MDB-MS), afirmou que complementação do relatório não é um novo parecer e indeferiu o pedido. Simone também rejeitou questão de ordem do senador Humberto Costa (PE) que apresentou um questionamento sobre o procedimento de votação da PEC paralela.

Andamento do processo

Agora o texto vai passar por dois turnos de votação no Plenário do Senado, onde precisará ser aprovado por três quintos dos senadores, o que equivale a 49 votos. O presidente Davi Alcolumbre pretende que o plenário vote a PEC na quarta-feira da próxima semana, dia 11 de setembro. “Há alguma divergência em relação a prazos, mas se não houver objeção de líderes partidários ou partidos políticos, a gente vai tentar botar na quarta-feira da semana que vem, em primeiro turno. Se dentro do entendimento e do acordo estabelecido não prejudicar o calendário, a gente pode adiar para a outra semana para tentar cumprir o acordo de procedimento”, disse.

Ele tem a expectativa de concluir a votação da proposta até 10 de outubro. Se for aprovado, sem mudanças, o texto será promulgado como uma emenda à Constituição.

Os votos favoráveis e contrários:

A favor da proposta de Bolsonaro

Eduardo Braga (MDB-AM)

Mecias de Jesus (Republicanos-RR)

José Maranhão (MDB-PB)

Ciro Nogueira (PP-PI)

Esperidião Amin (PP-SC)

Alessandro Vieira (Cidadania-SE)

Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE)

Jorge Kajuru (Patriota-GO)

Antonio Anastasia (PSDB-MG)

Tasso Jereissati (PSDB-CE)

Marcos do Val (Podemos-ES)

Oriovisto Guimarães (Podemos-PR)

Juíza Selma (PSL-MS)

Marcos Rogério (DEM-RO)

Jorginho Mello (PL-SC)

Roberto Rocha (PSDB-MA)

Major Olímpio (PSL-SP)

Luiz Carlos Heinze (PP-RS)

Contra a proposta de Bolsonaro:

Veneziano Vital do Rego (PSB-PB)

Fabiano Contarato (Rede-ES)

Weverton Rocha (PDT-MA)

Humberto Costa (PT-PE)

Paulo Paim (PT-RS)

Rogério Carvalho (PT-SE)

Otto Alencar (PSD-BA)

Carlos Pompe

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