A deforma trabalhista converteu a CLT em lei do capital

Norma contra os trabalhadores emergiu do golpe do impeachment de 2016 que trouxe à tona a mora contumaz relativamente à verdade, à ética e aos supremos valores republicanos, que são vilipendiados cotidianamente

Por José Geraldo Santana de Oliveira*

O Decreto-lei 368, de 19 de dezembro de 1968, criou a figura de “empresa em mora contumaz relativamente a salários”, proibindo-a de pagar honorários a diretores, distribuir lucros e dividendos a sócios, ser dissolvida e de ser beneficiada de qualquer benefício de natureza fiscal e tributária ou financeira da União, estados e municípios.

A fantasmagórica realidade sócio-política que emergiu do golpe do impeachment de 2016 trouxe à tona a mora contumaz relativamente à verdade, à ética e aos supremos valores republicanos, que são vilipendiados cotidianamente.

No “Sermão do Bom Ladrão”, proferido na Igreja da Misericórdia de Lisboa, em 1655, Padre Antônio Vieira, afirmou que as autoridades portuguesas conjugavam o verbo furtar (rapio) por todos modos, tempos e pessoas, pelo imperativo, mandativo, optativo, conjuntivo, permissivo, e pelo modo infinito.

Parafraseando-o, pode-se afirmar que, no Brasil, abstraindo-se do verbo furtar, que não é o caso aqui, as autoridades e seus asseclas mentem e falseiam a realidade, igualmente, por todos, tempos e pessoas; fazendo-o em todas as dimensões da vida social.

Constitui-se em exemplo mais acabado e sempre recorrente a deforma trabalhista, iniciada em 2017, com a Lei 13.429, que rompeu todos os limites e barreiras que timidamente rondavam a terceirização, e com a Lei 13.467, que reescreveu a CLT, para convertê-la em consolidação das leis do capital, a pretexto de modernizar a legislação trabalhista, com vistas à segurança jurídica e à geração de empregos, que borbulharia aos milhões.

Passados quase 5 anos do início da vigência dessas danosas leis, não se entregou nada do que se prometeu, até porque isso não passava de surrado pretexto, posto que os mentirosos e falsários contumazes não têm sequer a dignidade de dizer a verdade; o resultado dessas leis, como efetivamente se pretendia, foi o aumento do desemprego, absoluta precarização das condições de trabalho, e o esgarçamento das entidades sindicais e, por consequência, da força dos trabalhadores,  e da Justiça do Trabalho.

Todavia, os tecelões de falsos discursos, todos desautorizados pela realidade concreta, que não se impressiona com os falsos proselitismos deles, continuam insistindo na velha cantilena de que tal deforma não reduziu direitos e que manteve incólume aqueles assegurados pelo Art. 7º, da Constituição Federal (CF).

Essa cantilena soa como deboche social e colossal atentado contra a inteligência e à boa-fé dos trabalhadores e de quantos não são versados nas armadilhas de leis feitas sob encomenda, como as que se acham sob comentários.

Nominalmente, nenhum dos 34 incisos que compõem o Art. 7º, da CF, foi suprimido, até porque isso seria teratológico, na hierarquia das normas jurídicas; porquanto lei alguma tem o condão de alterar a CF.

Não obstante a preservação nominal dos direitos elencados no referido dispositivo constitucional, a deforma trabalhista, a pretexto de regulamentá-lo, o que é constitucionalmente permitido, esvaziou o conteúdo da maioria desses. Importa dizer: a regulamentação reduziu drasticamente o alcance social, fazendo letra morta de muitos desses.

Essa assertiva é facilmente confirmada pelo simples cotejo dos dispositivos constitucionais, insertos no Art. 7º, com os das normas contidas na comentada deforma trabalhista, como demonstra o quadro abaixo.

O comando constitucional sob destaque dispõe que seus 34 incisos têm como objeto único, insuscetível de revogação e/ou esvaziamento do conteúdo, a melhoria da condição social dos trabalhadores urbanos e rurais. Porém, as leis ordinárias em questão objetivam, em todos os dispositivos, sem exceção o oposto, ou seja, a piora das condições sociais.

Com o escopo de proporcionar efetividade à melhoria preconizada, o comentado comando constitucional assegura:

I – Relação de emprego protegida contra despedida arbitrária ou sem justa causa, nos termos de lei complementar, que preverá indenização compensatória, dentre outros direitos.

A Lei 13.467/17, no Art. 477-A, consagra exatamente o contrário. Ou seja, abre largos para a despedida arbitrária e sem justa causa, sem qualquer justificativa e/ou restrição.

“Art. 477-A. As dispensas imotivadas individuais, plúrimas ou coletivas equiparam-se para todos os fins, não havendo necessidade de autorização prévia de entidade sindical ou de celebração de convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho para sua efetivação.”

II – Seguro-desemprego, em caso de desemprego involuntário.

A Lei 13.467/17 exclui desse direito constitucional os trabalhadores submetidos a contrato de trabalho autônomo e intermitente e os que tiverem seus contratos rescindidos por “acordo”.

“Art. 442-B. A contratação do autônomo, cumpridas por este todas as formalidades legais, com ou sem exclusividade, de forma contínua ou não, afasta a qualidade de empregado prevista no art. 3º desta Consolidação.”

“Art. 443. O contrato individual de trabalho poderá ser acordado tácita ou expressamente, verbalmente ou por escrito, por prazo determinado ou indeterminado, ou para prestação de trabalho intermitente.

…………………………………………………………………………

  • 3º Considera-se como intermitente o contrato de trabalho no qual a prestação de serviços, com subordinação, não é contínua, ocorrendo com alternância de períodos de prestação de serviços e de inatividade, determinados em horas, dias ou meses, independentemente do tipo de atividade do empregado e do empregador, exceto para os aeronautas, regidos por legislação própria.” (NR)

“Art. 444. …………………………………………………..

Parágrafo único. A livre estipulação a que se refere o caput deste artigo aplica-se às hipóteses previstas no art. 611-A desta Consolidação, com a mesma eficácia legal e preponderância sobre os instrumentos coletivos, no caso de empregado portador de diploma de nível superior e que perceba salário mensal igual ou superior a duas vezes o limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social.” (NR)

“Art. 452-A. O contrato de trabalho intermitente deve ser celebrado por escrito e deve conter especificamente o valor da hora de trabalho, que não pode ser inferior ao valor horário do salário mínimo ou àquele devido aos demais empregados do estabelecimento que exerçam a mesma função em contrato intermitente ou não.

  • 6º Ao final de cada período de prestação de serviço, o empregado receberá o pagamento imediato das seguintes parcelas:

I – remuneração;

II – férias proporcionais com acréscimo de um terço;

III – décimo terceiro salário proporcional;

IV – repouso semanal remunerado; e

V – adicionais legais.

“Art. 484-A. O contrato de trabalho poderá ser extinto por acordo entre empregado e empregador, caso em que serão devidas as seguintes verbas trabalhistas:

I – por metade:

  1. a) o aviso prévio, se indenizado; e
  2. b) a indenização sobre o saldo do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço, prevista no § 1º do art. 18 da Lei 8.036, de 11 de maio de 1990;

II – na integralidade, as demais verbas trabalhistas.

[..]

  • 2º A extinção do contrato por acordo prevista no caput deste artigo não autoriza o ingresso no Programa de Seguro-Desemprego.”

III – Fundo de garantia do tempo de serviço.

A Lei 13.467/17 exclui desse direito os autônomos (Art. 442-B) e os impropriamente chamados hipersuficientes (Art. 443, § 3º), mencionados no inciso anterior.

IV – Salário mínimo, fixado em lei, nacionalmente unificado, capaz de atender às suas necessidades vitais básicas e às de sua família com moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social, com reajustes periódicos que lhe preservem o poder aquisitivo, sendo vedada sua vinculação para qualquer fim.

A Lei 13.467/17 exclui dessa garantia os trabalhadores sob contrato autônomo e intermitente, Art. 442-B, os primeiros, 443, § 3º, e 452-A, os segundos, transcritos no inciso II.

[..]

VII – Garantia de salário, nunca inferior ao mínimo, para os que percebem remuneração variável.

Os trabalhadores autônomos (442-B), os intermitentes (443, § 3º, e 452-A) e os hipersuficientes (444) não usufruem dessa garantia constitucional, por força da Lei 13.467/17.

VIII – Décimo terceiro salário com base na remuneração integral ou no valor da aposentadoria.

Os autônomos (442-B) e os hipersuficientes (444) não são alcançados por esse direito constitucional.

[..]

XI – Participação nos lucros, ou resultados, desvinculada da remuneração, e, excepcionalmente, participação na gestão da empresa, conforme definido em lei.

Os autônomos (442-B), os intermitentes (443, § 3º, e 452-A) e os hipersuficientes (444) não gozam desse benefício.

XII – Salário-família pago em razão do dependente do trabalhador de baixa renda nos termos da lei.

Os autônomos (442-B) não fazem jus a esse direito simbólico, por força da Lei 13.467/17.

XIII – Duração do trabalho normal não superior a 8 horas diárias e quarenta e quatro semanais, facultada a compensação de horários e a redução da jornada, mediante acordo ou convenção coletiva de trabalho.

A Lei 13.467/17, de plano, autoriza jornada de 10 horas, escala de 12×36, sem intervalo, e banco de horas, por meio “acordo individual”.

Art. 59. A duração diária do trabalho poderá ser acrescida de horas extras, em número não excedente de duas, por acordo individual, convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho.

[…]

  • 5º O banco de horas de que trata o § 2º deste artigo poderá ser pactuado por acordo individual escrito, desde que a compensação ocorra no período máximo de seis meses.
  • 6º É lícito o regime de compensação de jornada estabelecido por acordo individual, tácito ou escrito, para a compensação no mesmo mês.” (NR)

Art. 59-A. Em exceção ao disposto no art. 59 desta Consolidação, é facultado às partes, mediante acordo individual escrito, convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho, estabelecer horário de trabalho de doze horas seguidas por trinta e seis horas ininterruptas de descanso, observados ou indenizados os intervalos para repouso e alimentação.

Parágrafo único. A remuneração mensal pactuada pelo horário previsto no caput deste artigo abrange os pagamentos devidos pelo descanso semanal remunerado e pelo descanso em feriados, e serão considerados compensados os feriados e as prorrogações de trabalho noturno, quando houver, de que tratam o art. 70 e o § 5º do art. 73 desta Consolidação.”

[..]

XV – Repouso semanal remunerado, preferencialmente aos domingos.

O direito do repouso semanal, preferencialmente aos domingos, foi esvaziado pelo STF, no julgamento da ADI 3975, autorizando-o de vez em quando aos domingos, como se colhe da Ementa de Acórdão:

“Ação Direta de Inconstitucionalidade. 2. Lei Federal 11.603/2007. Atividade do comércio aos domingos e feriados. 3. Alegada violação ao disposto no art. 7º, XV, da CF. Inexistência. 4. A Constituição, apesar de encorajar o repouso semanal aos domingos, não exige que o descanso nele aconteça. Precedentes. 5. Ação julgada improcedente”.

XVI – Remuneração do serviço extraordinário superior, no mínimo, em 50% à do normal.

Essa garantia teve sua eficácia esvaziada pelos Art. 59, §§ 3º, 5º e 6º, e 59-B, por meio de compensação de jornada e banco de horas, “autorizados por acordos individuais”.

Art. 59. A duração diária do trabalho poderá ser acrescida de horas extras, em número não excedente de duas, por acordo individual, convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho.

[..]………………………………………………………………………….

  • 3º Na hipótese de rescisão do contrato de trabalho sem que tenha havido a compensação integral da jornada extraordinária, na forma dos §§ 2º e 5º deste artigo, o trabalhador terá direito ao pagamento das horas extras não compensadas, calculadas sobre o valor da remuneração na data da rescisão.

[..]

  • 5º O banco de horas de que trata o § 2º deste artigo poderá ser pactuado por acordo individual escrito, desde que a compensação ocorra no período máximo de seis meses.
  • 6º É lícito o regime de compensação de jornada estabelecido por acordo individual, tácito ou escrito, para a compensação no mesmo mês.”

[..]

“ Art. 59-B. O não atendimento das exigências legais para compensação de jornada, inclusive quando estabelecida mediante acordo tácito, não implica a repetição do pagamento das horas excedentes à jornada normal diária se não ultrapassada a duração máxima semanal, sendo devido apenas o respectivo adicional.

Parágrafo único. A prestação de horas extras habituais não descaracteriza o acordo de compensação de jornada e o banco de horas.”

XVII – Gozo de férias anuais remuneradas com, pelo menos, um terço a mais do que o salário normal.

O Art. 134, § 1º, da CLT, com a redação dada pela Lei 13.467/17, autoriza o fracionamento das férias em até 3 períodos, por “acordo individual”, não podendo um deles ser inferior a 14 dias, que é o tempo mínimo necessário para a descompressão do estresse do trabalho, nos termos do Art. 8º, da Convenção 132, da Organização Internacional do Trabalho (OIT), ratificada pelo Brasil.

Desse modo, a rigor, na melhor das hipóteses, anualmente, o trabalhador conseguirá desestressar-se do trabalho, não chegando efetivamente a gozar das férias, posto que os 16 dias restantes, além de não serem concomitantes com os 14 referidos no parágrafo anterior, podem ser fracionados em 2 de 8 dias cada 1, ou, 1 de 5 dias, e outro, de 10. Isso, em datas posteriores àquela que esteve de férias por 14 dias.

“Art. 134. …………………………………………………….

  • 1º Desde que haja concordância do empregado, as férias poderão ser usufruídas em até três períodos, sendo que um deles não poderá ser inferior a quatorze dias corridos e os demais não poderão ser inferiores a cinco dias corridos, cada um”.

[..]

XX – Proteção do mercado de trabalho da mulher, mediante incentivos específicos, nos termos da lei.

Ao reverso do que preconiza esse inciso, a Lei 13.467/17 desprotegeu o trabalho da mulher grávida e da lactante, autorizando seu trabalho em atividades insalubres, no Art. 394-A, declarado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal (STF) na ação direta de inconstitucionalidade (ADI) 5938.

“Art. 394-A . Sem prejuízo de sua remuneração, nesta incluído o valor do adicional de insalubridade, a empregada deverá ser afastada de:

I – atividades consideradas insalubres em grau máximo, enquanto durar a gestação;

II – atividades consideradas insalubres em grau médio ou mínimo, quando apresentar atestado de saúde, emitido por médico de confiança da mulher, que recomende o afastamento durante a gestação;

III – atividades consideradas insalubres em qualquer grau, quando apresentar atestado de saúde, emitido por médico de confiança da mulher, que recomende o afastamento durante a lactação.

EMENTA: DIREITOS SOCIAIS. REFORMA TRABALHISTA. PROTEÇÃO CONSTITUCIONAL À MATERNIDADE. PROTEÇÃO DO MERCADO DE TRABALHO DA MULHER. DIREITO À SEGURANÇA NO EMPREGO. DIREITO À VIDA E À SAÚDE DA CRIANÇA. GARANTIA CONTRA A EXPOSIÇÃO DE GESTANTES E LACTANTES A ATIVIDADES INSALUBRES. 1. O conjunto dos Direitos sociais foi consagrado constitucionalmente como uma das espécies de direitos fundamentais, caracterizando-se como verdadeiras liberdades positivas, de observância obrigatória em um Estado Social de Direito, tendo por finalidade a melhoria das condições de vida aos hipossuficientes, visando à concretização da igualdade social, e são consagrados como fundamentos do Estado Democrático, pelo art. 1º, IV, da Constituição Federal. 2. A Constituição Federal proclama importantes direitos em seu artigo 6º, entre eles a proteção à maternidade, que é a ratio para inúmeros outros direitos sociais instrumentais, tais como a licença-gestante e o direito à segurança no emprego, a proteção do mercado de trabalho da mulher, mediante incentivos específicos, nos termos da lei, e redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança. 3. A proteção contra a exposição da gestante e lactante a atividades insalubres caracteriza-se como importante direito social instrumental protetivo tanto da mulher quanto da criança, tratando-se de normas de salvaguarda dos direitos sociais da mulher e de efetivação de integral proteção ao recém-nascido, possibilitando seu pleno desenvolvimento, de maneira harmônica, segura e sem riscos decorrentes da exposição a ambiente insalubre (CF, art. 227). 4. A proteção à maternidade e a integral proteção à criança são direitos irrenunciáveis e não podem ser afastados pelo desconhecimento, impossibilidade ou a própria negligência da gestante ou lactante em apresentar um atestado médico, sob pena de prejudicá-la e prejudicar o recém-nascido. 5. Ação Direta julgada procedente”.

XXI – Aviso prévio proporcional ao tempo de serviço, sendo no mínimo de trinta dias, nos termos da lei.

Os trabalhadores autônomos (442-B) e os em tese hipersuficientes (443, § 3º) não têm assegurado esse direito; e os que rescindem contrato por “acordo” (484-A), só o recebem por metade.

[..]

XXIV – Aposentadoria.

A redução do alcance da Previdência Social, tornando a aposentadoria mais miragem e menos perspectiva de realidade, deu-se com a EC (Emenda à Constituição) 103/19.

XXVI – Reconhecimento das convenções e acordos coletivos de trabalho.

O Art. 614, § 3º, da CLT, nega reconhecimento, portanto, validade jurídica, aos instrumentos normativos (convenções e acordos coletivos) que assegurem ultratividade das normas neles contidas e fixem a duração desse instrumento superior a 2 anos.

No entanto, tal validade é emprestada, sem ressalva, aos instrumentos normativos que restringirem e/ou reduzirem direitos, conforme o Art. 611-A, acrescido à CLT.

[..]

XXIX – Ação, quanto aos créditos resultantes das relações de trabalho, com prazo prescricional de cinco anos para os trabalhadores urbanos e rurais, até o limite de dois anos após a extinção do contrato de trabalho.

O § 2º, do Art. 11, com a redação dada pela Lei 13.467/17, reduz consideravelmente o alcance desse direito, ao estabelecer que, nas prestações de tratos sucessivos, que se repetem mês a mês, que não decorram de lei, a prescrição do direito de ação é total, após decorrido 5 anos da lesão.

Essa redução atinge direitos assegurados em instrumentos normativos, regulamentos de carreira e de acordo direto entre as partes etc.

Art. 11. A pretensão quanto a créditos resultantes das relações de trabalho prescreve em 5 anos para os trabalhadores urbanos e rurais, até o limite de 2 anos após a extinção do contrato de trabalho.

  • 2º Tratando-se de pretensão que envolva pedido de prestações sucessivas decorrente de alteração ou descumprimento do pactuado, a prescrição é total, exceto quando o direito à parcela esteja também assegurado por preceito de lei.

Para além disso, trouxe para o direito do trabalho a figura de prescrição intercorrente, que pode ocorrer no curso da ação de conhecimento e da própria execução; sempre, em benefício do devedor contumaz, que só tem a ganhar com a máxima protelação da satisfação de créditos trabalhistas, dos quais é devedor.

Art. 11-A. Ocorre a prescrição intercorrente no processo do trabalho no prazo de dois anos.

  • 1º A fluência do prazo prescricional intercorrente inicia-se quando o exequente deixa de cumprir determinação judicial no curso da execução.
  • 2º A declaração da prescrição intercorrente pode ser requerida ou declarada de ofício em qualquer grau de jurisdição.”

Faz-se imperioso registrar que a Lei 13.467/17 não se contentou em esvaziar o alcance de muitos dos direitos insertos no Art. 7º, da CF, como demonstrado acima, atentou, também, contra outras garantias constitucionais, notadamente quanto à inviolabilidade da  intimidade, da vida privada, da honra e da imagem dos trabalhadores, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação, garantida pelo inciso X, deste Art.; e ao direito de ação, assegurado pelos incisos XXXIV e XXXV, igualmente, do Art. 5º.

O Art. 223-G, acrescido à CLT, ao tratar do dano extrapatrimonial, a lei em questão vincula ao salário do trabalhador prejudicado o valor de possível indenização por dano moral, estabelecendo, por assim dizer, o vale quanto pesa; quebrando, com isso, o multissecular e universal princípio da isonomia.

Essa aberração foi objeto da ADI 6069, em tramitação no STF, encontrando-se com vistas para o ministro Nunes Marques, após voto do relator ministro Gilmar Mendes, julgando inconstitucional o limite sob destaque, admitindo-o apenas como referencial.

“Decisão: Após o voto do Ministro Gilmar Mendes (Relator), que conhecia das ADI 6.050, 6.069 e 6.082 e julgava parcialmente procedentes os pedidos formulados, para conferir interpretação conforme a Constituição, de modo a estabelecer que: 1) As redações conferidas aos art. 223-A e 223-B, da CLT, não excluem o direito à reparação por dano moral indireto ou dano em ricochete no âmbito das relações de trabalho, a ser apreciado nos termos da legislação civil; 2) Os critérios de quantificação de reparação por dano extrapatrimonial previstos no art. 223-G, caput e § 1º, da CLT deverão ser observados pelo julgador como critérios orientativos de fundamentação da decisão judicial. É constitucional, porém, o arbitramento judicial do dano em valores superiores aos limites máximos dispostos nos incisos I a IV do § 1º do art. 223-G, quando consideradas as circunstâncias do caso concreto e os princípios da razoabilidade, da proporcionalidade e da igualdade, pediu vista dos autos o Ministro Nunes Marques. Ausente, justificadamente, o Ministro Luiz Fux (Presidente), impedido neste julgamento. Presidiu o julgamento a Ministra Rosa Weber (Vice-Presidente). Plenário, 27.10.2021 (Sessão realizada por videoconferência – Resolução 672/2020/STF)”.

Como se não bastasse a regra do vale quanto pesa, o Art. 456-A, acrescido à CLT, autoriza o uso da imagem do trabalhador, independentemente de sua anuência, e sem nenhuma contraprestação financeira.

Art. 456-A. Cabe ao empregador definir o padrão de vestimenta no meio ambiente laboral, sendo lícita a inclusão no uniforme de logomarcas da própria empresa ou de empresas parceiras e de outros itens de identificação relacionados à atividade desempenhada”.

E mais: o Art. 507-A, acrescido à CLT, expressamente autoriza a exclusão da competência da Justiça do Trabalho lesões e ameaças a direitos, dos impropriamente chamados hipersuficientes.

Art. 507-A. Nos contratos individuais de trabalho cuja remuneração seja superior a duas vezes o limite máximo estabelecido para os benefícios do Regime Geral de Previdência Social, poderá ser pactuada cláusula compromissória de arbitragem, desde que por iniciativa do empregado ou mediante a sua concordância expressa, nos termos previstos na Lei 9.307, de 23 de setembro de 1996.”

Os Art. 790-B, caput e § 4º, e 791-A, § 4º, declarados inconstitucionais pelo STF, a rigor, excluem da apreciação da Justiça do Trabalho lesões e ameaças a direitos, de trabalhadores de baixa renda, ao estabelecer:

“Art. 790-B. A responsabilidade pelo pagamento dos honorários periciais é da parte sucumbente na pretensão objeto da perícia, ainda que beneficiária da justiça gratuita.

[..]

  • 4º Somente no caso em que o beneficiário da justiça gratuita não tenha obtido em juízo créditos capazes de suportar a despesa referida no caput, ainda que em outro processo, a União responderá pelo encargo.” (NR)

“Art. 791-A. 

[..]

  • 4º Vencido o beneficiário da justiça gratuita, desde que não tenha obtido em juízo, ainda que em outro processo, créditos capazes de suportar a despesa, as obrigações decorrentes de sua sucumbência ficarão sob condição suspensiva de exigibilidade e somente poderão ser executadas se, nos dois anos subsequentes ao trânsito em julgado da decisão que as certificou, o credor demonstrar que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão de gratuidade, extinguindo-se, passado esse prazo, tais obrigações do beneficiário.

“Decisão: O Tribunal, por maioria, julgou parcialmente procedente o pedido formulado na ação direta, para declarar inconstitucionais os art. 790-B, caput e § 4º, e 791-A, § 4º, da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), vencidos, em parte, os Ministros Roberto Barroso (Relator), Luiz Fux (Presidente), Nunes Marques e Gilmar Mendes. Por maioria, julgou improcedente a ação no tocante ao art. 844, § 2º, da CLT, declarando-o constitucional, vencidos os Ministros Edson Fachin, Ricardo Lewandowski e Rosa Weber. Redigirá o acórdão o Ministro Alexandre de Moraes. Plenário, 20.10.2021 (Sessão realizada por videoconferência – Resolução 672/2020/STF).

Aos descritos atentados à CF, acima comentados, somam-se as dezenas de modificações na CLT, promovidas pela Lei 13.467/17, com a finalidade de desproteger os trabalhadores, segundo o elegante manifesto assinado por 17 ministros do TST (Tribunal Superior do Trabalho), contra o PL (Projeto de Lei) e o PLC (Projeto de Lei da Câmara) 38/17, no Senado, que se converteu na lei sob impugnação, do qual consta a seguinte assertiva:

“A grande preocupação dos ministros do TST que subscrevem este documento […] é com o fato de o PLC 38/2017 (projeto da reforma trabalhista) eliminar ou restringir, de imediato ou a médio prazo, várias dezenas de direitos individuais e sociais trabalhistas”… –

Destarte, para que o Brasil possa reencontra-se com os pilares da CF, faz-se imperiosa a revogação da reforma trabalhista, simbolicamente falando, posto que juridicamente não se trata de ato simples nem único, só sendo possível por projeto de lei, aprovado nas duas casas do Congresso Nacional e sancionado pelo presidente da República.

Sem dúvida, para além de defenestrar Bolsonaro, aos 2 de outubro de 2022, essa tarefa de primeira ordem de todos quantos pugnam pelo Estado Democrático de Direito, que não se concretiza sem os valores sociais do trabalho (Art. 1º, IV, da CF), valorização do trabalho humano (Art. 170, caput, da CF), e primado do trabalho (Art. 193, da CF), que somam à Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948, do qual o Brasil é signatário de primeira hora; todos negados pela deforma trabalhista.

*José Geraldo Santana de Oliveira é consultor jurídico da Contee

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