Selic: Por que o Banco Central subiu a taxa de juros e quais são as consequências

Taxa de juros é o instrumento de política monetária usado para controlar a inflação

Durante quase seis anos, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) diminuiu sucessivamente a taxa básica de juros (Selic) no Brasil, respondendo a tempos de inflação baixa e a uma antiga demanda de indústrias e empresas, que queriam juros baixos para conseguir crédito mais barato e, assim, serem mais produtivas.

Esse ciclo de seis anos acabou nesta quarta-feira (17/3), quando o Copom decidiu por unanimidade aumentar a taxa Selic em 0,75 ponto percentual, de 2% para 2,75% ao ano.

A expectativa de economistas é de que novas altas sejam anunciadas nas próximas reuniões do Copom, ao longo dos próximos meses.

Por trás dessa mudança de rumo na política monetária está, principalmente, a preocupação com a inflação, que tem subido acima do esperado.

Mas os efeitos de juros mais altos vão além disso: embora o impacto de curto prazo para a população em geral seja visto como pequeno, economistas ouvidos pela BBC News Brasil explicam que, no longo prazo, a tendência de alta da Selic vai ter efeitos importantes no câmbio (ou seja, no valor do real perante o dólar) e na economia, com respingos na política.

Além disso, a mudança na Selic já tem provocado reações negativas de entidades que representam a indústria e o comércio.

É o que explicamos a seguir.

Selic e inflação

Ao longo dos últimos seis anos, “tivemos sucessivos períodos de queda da Selic para estimular a economia, diante da recessão vivida em 2015 e 2016, de (um cenário de) inflação controlada e, depois, deste período de pandemia”, explica o economista Reginaldo Nogueira, diretor-geral do Ibmec São Paulo e Brasília.

Com isso, a Selic, que já teve patamares muito mais altos – passou dos 14% em 2016, e chegou a 45% em 1999, só para citar alguns exemplos – chegou à casa dos 2% em meados de 2020 e assim se manteve até agora, no nível mais baixo das últimas décadas.

Até esta quarta-feira, a última elevação da Selic havia ocorrido em junho de 2015.

Mas eis que a inflação começou, recentemente, a dar sinais de que estava ganhando ímpeto.

Na semana passada, o IBGE calculou o IPCA (um dos índices que mede a inflação) de fevereiro em 0,86%, o maior registrado nesse mês desde 2016 e puxado pela alta nos combustíveis.

Em um cenário mais amplo, ao longo de um ano de pandemia (março de 2020 a fevereiro de 2021), a inflação sentida pelas pessoas mais pobres chegou a 6,75%, segundo cálculos do Ipea noticiados pela BBC News Brasil.

E a expectativa é de que a inflação continue subindo ao longo de 2021.

“As pressões inflacionárias vêm desde o ano passado. Algumas são passageiras, mas o impacto não está sendo tão temporário quanto o Banco Central imaginava até agora”, avalia Silvio Campos Neto, da consultoria Tendências.

“Efetivamente a inflação está piorando, com altas nos alimentos e nos combustíveis e se espalhando pela economia”, explica Josilmar Cordenonssi, professor de Economia da Universidade Presbiteriana Mackenzie.

A alta de juros promovida pelo BC, explica ele, serve como um “freio” a essa escalada, ao deixar o crédito mais caro (o que desestimula o consumo e o investimento das empresas) e, ao atrair capital – que busca se beneficiar dos juros mais altos -, favorecer uma valorização do real perante o dólar (o que diminui os custos de importados).

Impactos na população

Ainda não está claro até qual patamar o Copom elevará a Selic neste ano, diz Nogueira, porque isso vai depender não só do comportamento da inflação, mas de variáveis que estão longe do controle do Banco Central e que impactam muito a economia, como os níveis de emprego e consumo e até mesmo o ritmo de vacinação da população contra a covid-19.

Para a população em geral, os impactos de curto prazo serão pequenos, segundo Nogueira e Cordenossi: o crédito tende a ficar um pouco mais caro e o câmbio, um pouco mais estável, com o real um pouco mais valorizado perante o dólar, o que reduz a pressão inflacionária sobre combustíveis, por exemplo.

O crédito imobiliário, que se beneficiou de uma Selic mais baixa, não deve sentir tantas oscilações no curto prazo, “porque estávamos com uma taxa de juros bem abaixo dos nossos padrões históricos”, avalia Campos Neto, da Tendências.

Mas a baixa da inflação, de fato, só deve ser sentida ao longo de um período mais longo, já perto do final de 2021, dizem.

Para quem tem investimentos em renda fixa (como Tesouro Direto), a alta da Selic vai tornar essas aplicações um pouco mais rentáveis.

Do ponto de vista de investidores de grande porte, Cordenossi vê sinais otimistas a partir da decisão do Copom, que deve ajudar a calibrar as taxas de juros de longo prazo e “clarear o ambiente turvo para quem vai investir a longo prazo, ajudando a financiar investimentos produtivos”. Mas isso vai depender, também, de fatores que vão muito além dos juros, como reformas administrativa e tributária (ainda paradas), ambiente político e controle da crise sanitária, opina ele.

Reflexos políticos

Ao mesmo tempo, a alta de juros despertará críticas por parte do setor produtivo, por frear o consumo em meio a uma crise econômica.

“A demanda está muito fraca, não é o momento de subir os juros”, afirmou ao jornal Valor Econômico Carlos Thadeu de Freitas, chefe da divisão econômica da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC).

Em janeiro, o presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI) havia dito que, em um ano “desafiador” como 2021, “a manutenção da Selic em baixo patamar possibilita uma recuperação mais célere da atividade econômica e do emprego, uma vez que incentiva a demanda ao manter melhores condições de crédito para empresas e consumidores”.

Para Reginaldo Nogueira, do Ibmec, um outro ponto importante é que, ao aumentarem-se as taxas de juros, aumenta-se o custo da dívida brasileira.

“Isso deve gerar uma pressão cada vez maior sobre o Ministério da Fazenda para um ajuste fiscal de forma a sustentar esse crescimento da dívida”, prevê.

BBC

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