Câmara acelera votação de projeto que criminaliza pesquisas eleitorais; Lira fala em ‘regramento’

Deputados aprovaram urgência para projeto de 2011 que pune dirigentes quando resultado estiver fora da margem de erro. Presidente da Câmara diz que esse trecho não estará em nova versão

A Câmara dos Deputados decidiu nesta terça-feira (18) acelerar a votação de um projeto de lei de 2011 que criminaliza a divulgação de pesquisas eleitorais quando os resultados das urnas estiverem fora das margens de erro indicadas pelos institutos. Foram 295 votos a favor, 120 contrários e uma abstenção.

O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), colocou em votação um requerimento de 2014 que pedia urgência para esse texto. Com a urgência aprovada, o projeto de lei pode ir direto ao plenário, sem ser discutido nas comissões.

Lira disse, no entanto, que a intenção é construir um novo projeto de lei sobre o tema, e não votar o texto apresentado em 2011. O presidente da Câmara também firmou compromisso de que, no substitutivo que será colocado em votação, não haverá punições aos institutos de pesquisa.

“Estamos votando o requerimento de urgência de um projeto mais antigo, nada a ver com o mérito do que vai ser discutido. Fizemos o compromisso com os líderes da base hoje e com os líderes da oposição, vamos sentar para dialogar sobre o texto de mérito desse projeto. Depois de o texto [ser] resolvido, ele vem ao plenário quando estiver com o mínimo acordado possível”, disse o presidente da Casa.

“Não existe a possibilidade de ter um texto que trata de punição de pesquisa. Não podemos é não ter um posicionamento para que essa Casa não discuta um regramento dessas pesquisas”, afirmou Lira.

O presidente da Câmara declarou, ainda, que irá se reunir com o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), para tratar do assunto.

A proposta foi criticada por deputados da oposição.

“Esse projeto é uma forma de criminalização das pesquisas e a gente precisa ter um entendimento de que as pesquisas não são ciências exatas, inclusive elas são formas de trazer informações e a partir daquelas informações pode-se mudar o cenário das intenções de voto. Não se tem por que buscar métodos de criminalizar, que é o que está se propondo a fazer esse projeto”, afirmou a deputada Vivi Reis (PSOL-PA).

A deputada Erika Kokay (PT-DF) questionou a necessidade de aprovação da urgência para essa proposta e defendeu que as pesquisas são um “retrato” do momento.

“A pesquisa é um retrato, é uma foto. Não é um filme. Ela retrata um momento específico, esse momento pode ter variações, dois dias depois, três dias depois. Agora por que a urgência de se aprovar esse projeto no dia de hoje? Esse é um projeto que tem que ser maturado, discutido, tem que se escutar os institutos de pesquisa”, afirmou.

Um dos autores das propostas, o líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR) defendeu que o texto já seja analisado pelo plenário da Câmara nesta quarta-feira (19).

“Amanhã [quarta-feira] talvez a gente pudesse deliberar sobre esse tema, já que a urgência está aprovada e o deputado Paulo Martins [que será o relator da matéria] está à disposição dos senhores líderes para encontrar um texto que possa ser razoável. Senão, vamos colocar as opções todas num texto e votamos, primeiro, a proibição de pesquisas. Se passou, está resolvido. Se não passou, vamos colocar as alternativas seguintes”, disse.

A proposta

A urgência aprovada se refere a um projeto que estava há 10 anos parado na Câmara e prevê prisão de seis meses a um ano e multa de até R$ 1 milhão para divulgação de “pesquisa fraudulenta”.

A proposta amplia o conceito de “pesquisa fraudulenta” para considerar, também, aquelas divulgadas até cinco dias antes da eleição com resultado diferente da margem de erro registrada pelo instituto.

A esse texto foram apensadas outras 10 propostas do mesmo tema, para que todas tenham tramitação conjunta no Congresso. Um dos textos apensados é do líder do governo, Ricardo Barros (PP-PR), que apresentou a proposta após o primeiro turno das eleições.

O projeto de Barros cria, dentro da Lei das Eleições, o crime de “publicação de pesquisa eleitoral cujos números divergem dos resultados apurados nas urnas”.

Segundo a proposta do deputado, o crime seria publicar, 15 dias antes das eleições, pesquisa eleitoral com resultado diferente das urnas para além da margem de erro declarada. Estão sujeitos ao crime o estatístico, o responsável legal do instituto e o representante da empresa contratante. A pena para o crime é prisão de 4 a 10 anos e multa.

O projeto também obriga o veículo de comunicação a divulgar todas as pesquisas eleitorais registradas na Justiça Eleitoral no mesmo dia e no dia anterior, sob pena de multa de mil salários mínimos (hoje, cerca de R$ 1,2 milhão).

Na semana passada, o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Alexandre de Moraes, já havia tornado sem efeito a abertura de inquéritos tanto no Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) quanto na Polícia Federal para investigar os institutos de pesquisa.

Moraes destacou que cabe à Justiça Eleitoral a fiscalização das entidades de pesquisa. Para ele, a abertura das investigações “parecem demonstrar a intenção de satisfazer a vontade eleitoral manifestada pelo chefe do Executivo e candidato à reeleição” e que tais medidas poderiam caracterizar “desvio de finalidade e abuso de poder por parte de seus subscritores”.

Primeiro turno

Na última pesquisa Datafolha antes do primeiro turno, divulgada no sábado (1º), Jair Bolsonaro (PL) aparecia com 36% dos votos válidos. Pela margem de erro, poderia ter de 34% a 38%.

Já a pesquisa Ipec mostrava Bolsonaro com 37%. Pela margem de erro, ele teria de 35% a 39%.

Nas urnas, Bolsonaro teve 43,2% dos votos válidos, diferença de quatro a cinco pontos acima da margem de erro máxima nas duas pesquisas.

Já Luiz Inácio Lula da Silva (PT) aparecia com 50% dos votos válidos no Datafolha divulgado na véspera da eleição. Pela margem de erro, tinha de 48% a 52%.

A pesquisa Ipec indicava Lula com 51% dos votos.

Na margem de erro, teria entre 49% e 53%. Nas urnas, Lula conquistou 48,43% dos votos, dentro da margem do Datafolha, e um pouco fora da margem do Ipec.

Justificativa dos institutos

Após o primeiro turno, os dois principais institutos de pesquisa do país deram uma explicação parecida para o que aconteceu.

Segundo eles, a própria divulgação das pesquisas indicando a possibilidade de vitória de Lula no primeiro turno pode ter feito com que os eleitores de Ciro Gomes (PDT) e Simone Tebet (MDB) que votariam em Jair Bolsonaro no segundo turno antecipassem suas escolhas para o primeiro. Ou seja, a informação fornecida pelas pesquisas ajudou os eleitores a fazerem suas escolhas na última hora.

Márcia Cavallari, diretora do Ipec, explicou como isso teria acontecido.

“A última pesquisa divulgada na véspera da eleição mostrava que o presidente Lula poderia ganhar a eleição no primeiro turno, e de fato ele ficou a 1,6% dos votos de ganhar no primeiro turno. O presidente Jair Bolsonaro, por sua vez, teve seis pontos a mais do que a pesquisa apontava, e analisando os resultados nós vemos que houve uma migração dos 3% de indecisos que ainda tínhamos na pesquisa na véspera da eleição e o índice do Ciro e da Simone que ficaram menores. Então, talvez com essa informação os eleitores tomaram uma ação estratégica de antecipar um possível voto no segundo turno neste primeiro para impedir que a eleição acabasse no primeiro turno”, disse.

A diretora do Datafolha, Luciana Chong, fez uma avaliação parecida.

“O que a gente viu na pesquisa de véspera foi um índice ainda de 13% de eleitores que declararam que ainda poderiam mudar o seu voto. E entre os eleitores de Ciro esse índice era de 41%, e entre os de Simone Tebet chegava a 37%. Então a pesquisa de véspera foi finalizada no sábado, por volta da hora do almoço, e dali até o domingo, o dia da eleição, a gente viu um movimento de eleitores que votavam no Ciro, Tebet, branco e nulo indo para o presidente Jair Bolsonaro. Então o voto útil que não aconteceu a favor de Lula, aconteceu a favor de Bolsonaro nessa reta final”, afirmou.

G1

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