Sinpro/RS: Novos cursos de Medicina são alvo de debate no STF

Argumentos a favor e contra chamada pública para abertura de novos cursos de Medicina esteve no centro da pauta do encontro

Na segunda-feira, 17, o Supremo Tribunal Federal (STF) realizou audiência pública sobre o funcionamento dos cursos de Medicina.

A audiência foi coordenada pelo ministro Gilmar Mendes, para ouvir as partes interessadas na Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) 81 e da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 7187.

Também participaram autoridades do Poder Executivo, do Conselho Nacional de Saúde, de parlamentares e de entidades dos setores médico e educacional.

A memória em vídeo da audiência está no canal da TV Justiça.

Insegurança jurídica

De acordo com Elizabeth Guedes, presidente da Associação Nacional das Universidades Particulares (Anup), “a concessão de liminares para a abertura de novos cursos sem chamamento público traz insegurança jurídica ao setor”. Ela defende uma barreira de entrada para novos cursos, em razão da complexidade da disciplina. A Anup é a autora da ADC 81.

O coordenador-geral de Direito Social, Econômico e Infraestrutura da Procuradoria-Geral da União (PGU), Marcelo Moura da Conceição vai na mesma direção.

Ele afirma que as liminares também representam um risco social à formação de médicos sem condições mínimas para o exercício profissional.

Liberdade econômica e reserva de mercado

Representando o Conselho de Reitores das Universidades Brasileiras (Crub), autor da ADI 7187, Ingo Wolfgang Sarlet afirmou que a exigência viola os princípios da liberdade econômica, da livre concorrência e da proibição de retrocesso. Na sua avaliação, a restrição a novos cursos aumenta o custo das mensalidades, diante da escassez de oferta.

Distribuição dos médicos

Já para o coordenador-executivo do Sistema de Acreditação de Escolas Médicas (Saeme), Milton de Arruda Martins, o problema não reside na quantidade de médicos, mas na sua distribuição desses profissionais no Brasil.

Entre 2011 e 2020, foram abertos mais de 167 cursos de Medicina no país.

Equilíbrio

O deputado federal Ricardo Barros (PP-PR), ex-ministro da Saúde (no governo Michel Temer, MDB), defendeu que os cursos de Medicina tenham hospitais próprios. “Além de contribuir para a qualidade do ensino e a interiorização da formação dos profissionais, a medida traria equilíbrio, pois o curso é altamente rentável, e a manutenção do hospital é deficitária”, defende.

Qualidade dos cursos

Representantes do governo federal defenderam o chamamento público para garantir a qualidade dos cursos. O ministro da Educação, Victor Godoy, expressou preocupação com as autorizações provisórias para o funcionamento dos cursos. Para ele, o essencial é garantir que o estudante tenha a segurança de que vai adquirir habilidades e competências para o exercício da Medicina.

Saúde básica

O atual ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, enfatizou a necessidade de médicos que cuidem da saúde básica da população. Para ele, a melhor forma de resolver a questão é focar na qualificação das escolas existentes e na aplicação de exames de progresso.

Interesse público

Para o advogado-geral da União, Bruno Bianco, a lei do Mais Médicos (de 2013) estabeleceu parâmetros mais rigorosos para a formação de profissionais na área. As exigências visam ao interesse público e ao ensino médico de qualidade.

Defesa econômica

O conselheiro do Tribunal Administrativo de Defesa Econômica, Gustavo Augusto Freitas de Lima, explicou que o órgão analisa, em relação à abertura de novos cursos, os critérios de preço e bem-estar social – que engloba os custos à sociedade de um ensino de má qualidade.

Ampliação

A competência legal do Conselho Nacional de Saúde (CNS) para analisar pedido de abertura de cursos de medicina foi defendida pela representante da entidade, Francisca Valda da Silva. Segundo ela, é necessário ampliar o número de médicos no país, e o programa Mais Médicos é insuficiente para atender a demanda de profissionais.

Parlamentares

Deputados federais médicos defenderam maior rigor na avaliação dos cursos de Medicina já existentes e dos hospitais que atuam na formação prática da residência. Hiran Gonçalves (PP-RR) – oftalmologista, legista e presidente da Frente Parlamentar da Medicina no Congresso Nacional – criticou o funcionamento de faculdades de Medicina amparado em liminares.

Dr. Frederico (Patriota-MG), oncologista, e Doutor Luizinho (PP-RJ), ortopedista, elogiaram o atendimento básico nas unidades de saúde, mas afirmaram que é nos hospitais que os alunos têm aprendizado prático. Eles defenderam, ainda, um exame de proficiência para os recém-formados.

Avaliação criteriosa

Segundo o médico Raul Cutait, a formação médica exige mais de 7 mil horas/aula, inclusive práticas. Em sua avaliação, antes de abrir novas vagas, o importante é deixar as faculdades competentes funcionarem e avaliar criteriosamente os currículos, os alunos, as faculdades e os centros de treinamento técnico que já existem.

Entidades médicas

Na segunda parte da audiência, representantes de conselhos e associações médicas defenderam a exigência do chamamento público. Para o grupo, o problema não é apenas a baixa quantidade de médicos por habitantes, mas a qualidade da formação desses profissionais. “A qualificação deve se sobrepor aos problemas de infraestrutura”, disse Angelo Vattimo, do Conselho Regional de Medicina Estado de São Paulo.

A médica e professora Ludhmila Hajjar observou que cerca da metade dos médicos não tem título de especialista, que é o que qualifica um profissional. Os palestrantes também mostraram preocupação com o déficit de corpo docente qualificado para atender à profusão de novas escolas.

Para garantir a qualidade do ensino, eles sugeriram priorizar a autorização de abertura de escolas que tenham hospitais e programa de residência próprios e formação humanística e ética dos alunos.

Rede de saúde e integração com universidades

Para o neurologista Silvio Pessanha Neto, avaliador do sistema de acreditação de escolas médicas do MEC, a qualidade dos cursos está diretamente relacionada à capacidade de sua integração à rede de saúde. Segundo o médico Rodrigo Matos, as contrapartidas do modelo do Mais Médicos, como bolsas para estudantes carentes e exigência de residência médica, é uma evolução. Atual provedor da Santa Casa de Misericórdia de Feira de Santana (BA), ele afirmou que esses fatores ajudam a fixar os médicos e a melhorar a qualidade do atendimento à população local.

Para Samara Agostinho, coordenadora-geral da Direção Executiva Nacional dos Estudantes de Medicina, a oferta de cursos de residência em mais municípios favorece a interiorização da profissão e fortalece o SUS. Segundo ela, é preciso tornar a profissão menos elitizada, com a inclusão de indígenas, quilombolas e pessoas de comunidades periféricas.

Novos cursos de medicina e qualidade na formação

A Associação Brasileira das Instituições Comunitárias de Educação Superior e o Sindicato dos Estabelecimentos Particulares de Ensino do Estado do Pará, representados por Henrique Sartori, consideram que o Mais Médicos não funciona mais para a educação brasileira. Em nome da Associação Nacional dos Centros Universitários, José Machado afirmou que o programa, apesar de melhorias, mantém a desigualdade na distribuição de médicos, e a formação dos profissionais não preenche as reais necessidades do Brasil.

Pela Sociedade Brasileira de Ortopedia e Traumatologia, Luiz Carlos Sobania afirmou que não há falta de médicos, mas de qualidade dos cursos. No mesmo sentido, ao representar o Colégio Brasileiro de Radiologia, Dante Escuissato mostrou preocupação quanto à capacitação dos profissionais, recomendando a avaliação das estruturas dos cursos e dos dos alunos. Na mesma linha, Cristina Menezes, da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica, salientou que a qualidade da formação profissional é mais importante do que a quantidade de profissionais.

Livre iniciativa

Segundo a Associação Brasileira de Mantenedoras das Faculdades Isoladas e Integradas, representadas por Paulo Chanan, dizer que o MEC não tem condições de atuar e condenar todos os novos cursos realizados e, consequentemente, os profissionais já formados. Em nome da Federação Interestadual das Escolas Particulares, Diego Donoso mostrou preocupação com a possibilidade de uma restrição absoluta, pelo Estado, das atividades no setor de medicina.

Para a Confederação Nacional dos Estabelecimentos de Ensino, representada por Anna Dianin, a discussão da qualidade de ensino deve ser ampliada para outras profissões. Pelo Fórum das Entidades Representativas do Ensino Superior Particular, Bruno Coimbra defendeu o direito da livre iniciativa das instituições de ensino.

Interiorização da formação médica

Ao participarem do terceiro bloco da audiência pública, representantes de municípios defenderam o programa Mais Médicos e ressaltaram a importância da interiorização dos cursos de medicina através da formação dos profissionais em suas cidades. A secretária de Saúde de Alagoinhas (BA), Laina Lôbo, afirmou que a mão de obra médica é relevante em seu município, principalmente para as populações mais vulneráveis, como quilombolas e indígenas.

O prefeito de Jaraguá do Sul (SC), José Jair Franzner, observou que programas na área da saúde são realizados em parceria com a faculdade, a exemplo da capacitação de professores para a realização de primeiros socorros. A secretária de Saúde de Cruzeiro do Sul (AC), Valéria Lima, relatou os atendimentos itinerantes em locais de difícil acesso e avaliou que a existência de um curso de medicina em sua cidade faz com que os profissionais não precisem sair da região para se qualificar.

Do jornal Extra Classe, do Sinpro/RS

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